Há uma tendência em se avaliar Laodiceia como a pior entre as sete igrejas do Apocalipse. Isso devido à dura linguagem a ela associada. Aquele trecho que menciona frio ou quente, se for morno vomita-se, é o responsável por essa avaliação precipitada.
Então ninguém deseja ser a igreja de Laodiceia, ao contrário de sua vizinha, Filadélfia, com a qual todos desejam se identificar. Mas é precipitada essa leitura. Porque, como já dissemos, Jesus ama todas por igual e, de modo meticuloso, provê restauração.
E Laodiceia recebe uma promessa, dessas registradas ao final da carta, para quem supera suas dificuldades, aceita o diagnóstico de Jesus e avança para a sua própria cura, talvez, comparativamente, a mais elevada.
No Apocalipse, logo após a introdução, com a primeira fantástica visão de Jesus Glorificado e essa dedicatória das cartas, João é convocado aos céus, onde divisa um trono, no qual quem senta é guarnecido pelos quatro seres viventes, que não cessam de advertir Santo, Santo, Santo.
Pois nesse trono somente o Cordeiro pode tomar assento, porque está claro ser o trono de Deus. Aliás, essa superposição das duas pessoas, Pai e Filho, nesse mesmo lugar, é, no Apocalipse, uma indicação da identidade dos dois sendo um só, como no Evangelho de João.
Pois confira que, na promessa de Jesus aos crentes vitoriosos, em Laodiceia, consta sentar-se, juntamente com o Cordeiro, nesse exato trono. Daí a constatação de que, essas promessas da conclusão das cartas, às sete igrejas, além de sempre pressupor restauração completa, eleva com um convite de se privar da glória de Deus.
E para a igreja de Laodiceia, Jesus afirma o que podemos chamar de paradoxo, que é quando um arroubo ou um exagero de linguagem está posto. Uma contradição. Mas tratando-se de uma palavra de Jesus, é real, segura e fiel. E uma vez aplicada a Laodiceia, coloca-a no mesmo nível de restauração de todas as outras.
O modo como Jesus se apresenta à igreja, semelhante à primeira e dura palavra a Sardes, igreja com nome de que vive, Laodiceia com identidade morna. Por isso ele afirma ser testemunha fiel e verdadeira e princípio da criação de Deus. Desse modo, reafirma referenciais dos quais a igreja em Laodiceia havia se afastado.
Chamar-se "princípio da criação" não significa ter sido o pirmeiro a ser criado, mas fonte da criação. E logo a palavra de Jesus evoca, da igreja, uma decisão por resgate de sua identidade: frio ou quente, porque ser morna, provoca náuseas ou ânsia por ser vomitada.
Essa postura da igreja lembra a exortação de Elias ao Israel do século nono antes da era cristã, quando ele interpela o povo, "até quando coxeareis entre Deus e Baal". A igreja pressupõe ser rica, enxergar e ter sua santidade preservada.
Jesus revela sua postura real, estar miserável, pobre, cega e nua. Embora seja uma linguagem figurada, sua aplicação pode ser literal, no sentido, por exemplo, da crítica que Tiago fez aos ricos da comunidade a quem escreveu sua epístola. E ao indevido trato de requinte recebido por eles, enquanto os demais irmãos se sentiam menores. Isso poderia estar ocorrendo nesta igreja.
Muito comum, às vezes imperceptivelmente mas, o que é muito mais triste, noutras vezes assumido como um direito social, quando, realmente, encontramos "igrejas de elite" ou que assim jujgam a si mesmas, sendo verdadeiras símiles, ao inverso, são como arremedo de Laodiceia.
Abrigam dentro de si muitos que precisam, na verdade, ser classificados por Jesus como cegos, como se fossem incrédulos, pobres, por não privar da riqueza eterna, miseráveis, por não refletirem a necessidade que têm da misericórdia de Deus e nus, fora do paraíso e sem as vestes brancas de santidade, pelo sangue de Jesus.
Jesus afirma pôr-se à porta. Ele convida que seja aceito. Jesus não invade a vida de ninguém. O que oferece, por sua graça, é riqueza das virtudes de Deus, ouro refinado, vestes brancas, sempre símbolo de cobertura que esconde nudez, como símbolo negativo de postura pecaminosa, diante de Deus, e colírio que faz enxergar, com lucidez e discernimento, a vontade de Deus, sempre "boa, agradável e perfeita", Rm 12,2b.
Por mais inversa e avessa que seja a condição dos crentes daquela igreja, somatório das situações que os mergulharam nessa posição dúbia, de perda de identidade, Jesus tem capacidade de tudo reverter e faz um convite voluntário para isso.
A menção de vestes, como num requinte de uma nova moda, asseio e elegância, um bálsamo para os olhos, que lhes permite cura, brilho e resgate da visão, bem como a riqueza, não no sentido humano, símbolo invertido de importância e depreciação social, mas dos valores que se projetam para a eternidade, a beleza dessa restauração enche de esperança e garante o resgate da identidade de toda a igreja.
"Ao vencedor darei o direito de sentar-se comigo em meu trono, assim como eu também venci e sentei-me com meu Pai em seu trono." Esta promessa e a declaração de amor, em Ap 3,19, "Repreendo e disciplino aqueles que eu amo. Por isso, seja diligente e arrependa-se.", colocam Jesus perto, à mesa, ceando em intimidade com os que o acolhem.
Para cada e todas as igreja há uma mensagem de esperança. Nunca deixam de ser igreja. Jesus é sempre seu Pastor e Bispo. Ele as têm na mão, bem como a seus pastores e liderança. Ouvir sua palavra, como se recomenda, pelo Espírito, é certeza de cumprimento completo da vocação que, em Cristo, receberam.
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