Naquele dia, estava no centro do Rio, às voltas com a burrada de uma gerente de conta bancária, que havia efetuado uma mixórdia com a conta da igreja.
Naquele dia, estava no centro do Rio, às voltas com a burrada de uma gerente de conta bancária, que havia efetuado uma mixórdia com a conta da igreja.
¹² "Ensina-nos a contar os nossos dias, para que alcancemos coração sábio." Sl 90.
Alarmou. Ligaram para nós. Para tudo. Estamos indo para lá. Eu e Regina nos entreolhamos. Avisamos à tia: para tudo. Avisamos no Quinari que a gente ia ficar no plantão. Era domingo. E que domingo! Asafe iria nascer nesse domingo.
As
vogais hebraicas são representadas por sinais que não fazem parte do alfabeto.
Na verdade, originalmente as vogais não são escritas no hebraico (elas
são pronunciadas, mas não escritas).
Porém
em algum momento foi criada uma solução para esta barreira, que poderia
ter colocado em risco a preservação da língua hebraica e do texto bíblico
original. Neste artigo você vai entender como funcionam os sinais das
vogais em hebraico, quais são e como surgiram.
Como
é ler um texto sem vogais
No artigo anterior nós
falamos sobre o alfabeto
hebraico. Nós vimos que as letras hebraicas foram criadas para
representar sons, mas apenas as consoantes (exceto uma vogal
ou outra em alguns casos).
Fazendo
uma analogia com o português, vimos um exemplo com os versículos de Gênesis 1:1
e 2. Caso em português nós escrevêssemos sem vogais, como no hebraico, ficaria
mais ou menos assim:
“N
PRNCPO CRO DUS OS CS E A TRRA. A TRRA PRM ESTV SM FRMA E VZIA. HVI TRVS SBR A
FC D ABSM E O SPRT D DUS PIRV SBR A FC DS AGAS”.
Ficaria
um pouco difícil para ler, principalmente para alguém que não soubesse falar
português. É o que acontece no hebraico. As palavras são escritas sem vogais, e
só quem sabe falar a língua com fluência é que consegue ler corretamente.
Para
quem está começando a aprender a ler o hebraico ficaria muito difícil – na
verdade impossível, pronunciar corretamente as palavras.
Acontece
que chegou uma época em que o hebraico já não era uma língua falada por
ninguém. Os judeus viviam em diversos países ao redor do mundo, e quase ninguém
mais falava o idioma fluentemente.
O
hebraico se tornou uma língua “litúrgica”, só era usado nas
orações, cânticos e leituras na sinagoga. Já estava ficando difícil para a
maioria das pessoas conseguir ler a Torá em hebraico, porque
ninguém sabia pronunciar direito, somente as pessoas mais eruditas.
Os Massoretas
Finalmente
um grupo de escribas, chamados de massoretas, que conheciam muito
bem a língua hebraica e o texto bíblico, tomaram uma providência para preservar
a pronúncia do hebraico e o correto entendimento das escrituras bíblicas. Isto
ocorreu mais ou menos a partir do século VI.
Eles
resolveram criar sinais para representar as vogais hebraicas. Eles não criaram
novas letras, para não alterar a escrita original das palavras, apenas
acrescentaram estes sinais, que eram pontos e traços ao redor das palavras.
Estes sinais são chamados de “Nekudot” (pontos), ou sinais
massoréticos.
Para
cada vogal foi criado um sinal, e em cada letra foi colocado um deles. Assim
ficou preservada a pronúncia dos textos sagrados em hebraico, e
consequentemente do idioma, e as pessoas que não sabiam falar fluentemente
passaram a conseguir a ler os textos com facilidade.
Imagine
agora aquele nosso texto em português usado como analogia, com vogais
acrescentadas. Poderia ficar assim:
“No PRiNCiPiO
CRiOu DeUS OS CeuS E A TeRRA. A TeRRA PoReM ESTaVa SeM FoRMA E VaZIA.
HaVIa TReVaS SoBRe A FaCe Do ABiSMo E O eSPiRiTo De DeUS
PaIRaVa SoBRe A FaCe DaS AGuAS”.
Agora
fica fácil de ler. Qualquer pessoa que não fala português poderia aprender a
ler um texto como este. Todas as vogais estão escritas – de uma maneira
diferente, mas estão.
Enfim
a escrita das vogais hebraicas – os “Nekudot”
Os
sinais das vogais hebraicas criados pelos massoretas ficaram assim:
Observe
que cada vogal tem duas formas diferentes de representar: Uma é chamada
de vogal longa, e a outra vogal breve.
Foram
criadas regras gramaticais bem rigorosas para fazer esta notação. Mas em termos
práticos, hoje em dia não existe nenhuma diferença na pronúncia entre
estas vogais breves e longas.
Os
dois A’s têm a mesma pronúncia, os dois E’s têm a mesma pronúncia, os dois I’s
têm a mesma pronúncia, os dois O’s têm a mesma pronúncia e os dois U’s têm a
mesma pronúncia.
Em
outras palavras, para aprender a ler, você não precisa se preocupar com
vogais longas e breves, apenas aprender os dois símbolos diferentes que
podem ser usados para cada vogal.
Estes
sinais têm nomes, mas absolutamente também não é necessário saber estes
nomes para você aprender a ler em hebraico.
Apenas
como curiosidade, ou caso você queira saber, estes são os nomes dos Nekudot –
os sinais das vogais hebraicas:
Temos
ainda mais um sinal, que é chamado de “Shvá”, que são dois pontos, um embaixo
do outro, embaixo da letra. Este sinal representa que a consoante não possui
nenhuma vogal, ou às vezes, dependendo da situação, pode ter som de E também.
Três
dos sinais das vogais também podem aparecer com um acréscimo dos dois pontos do
lado (o “shvá”), formando o que é chamado de “semivogal” – o que, novamente,
não interfere em nada na pronúncia – é apenas um detalhe gramatical.
Resumindo,
temos mais uma forma de representar o A, o E e o O, mas também não são
pronunciados diferente.
Como
funcionam os sinais das vogais hebraicas
Os
sinais são colocados embaixo das letras. Basta juntar o som da letra (que é uma
consoante) com o som da vogal e formar as sílabas.
Por
exemplo, a letra “Nun”, que tem som de N,
adicionada
a vogal A, que é um traço embaixo da letra, fica assim:
Esta
sílaba nós pronunciamos NA.
Se
colocarmos a vogal E, que são dois pontos embaixo da letra, fica assim:
Esta
sílaba pronunciamos NE.
E
assim por diante… podemos colocar qualquer vogal para cada letra.
Duas
letras do alfabeto podem fazer papel de vogal: A letra Vav ו, e a letra Yod י.
O
vav com o ponto em cima tem som de O, e o vav com o ponto embaixo tem som de U.
E a letra Yod tem som de I.
Estes
sinais se mantiveram até hoje, e é a maneira que permite a qualquer pessoa
aprender a ler em hebraico.
Porém,
estes sinais são utilizados apenas em Bíblias, e livros litúrgicos judaicos.
Acontece
que o hebraico foi restaurado como língua viva pelos judeus, e hoje em dia é a
língua oficial de Israel. Como as pessoas usam o idioma, e o conhecem de forma
fluente, as vogais já não são necessárias.
Por
isto, no hebraico moderno, não se escrevem os sinais das vogais. A
língua é escrita da forma tradicional, apenas as consoantes.
Apenas
em livros didáticos e livros para crianças são colocadas as vogais, servindo
para ajudar quem está sendo alfabetizado, além dos livros religiosos e
Bíblias, que são usados também por pessoas que não falam o hebraico
fluentemente.
Nos
rolos da Toráְ, que são pergaminhos ainda tradicionalmente manuscritos e usados
nas sinagogas, as vogais também não aparecem. O texto aparece da forma
tradicional.
Porém
nas Bíblia hebraicas impressas, as vogais estarão sempre lá para ajudar.
Se
você quer aprender a ler em hebraico, você pode começar agora mesmo assistindo
à primeira
aula da série de 11 aulas que eu preparei, onde eu ensino
passo-a-passo, de maneira bastante prática e simples, a ler cada sílaba.
Fonte:
https://jonathan-frate.com/2018/09/13/as-vogais-hebraicas/
A língua grega faz parte das línguas indo-europeias. O grego pertence a um ramo próprio das línguas indo-europeias e vem diretamente da língua protoindo-europeia. O grego moderno falado hoje passou por vários estágios de desenvolvimento. O protogrego, que é derivado diretamente da língua protoindo-europeia, originou o grego micênico. Este foi escrito numa escrita cuneiforme, chamada linear B. Por volta do ano de 800 a.c. foi substituído pela língua grega clássica. Aqui os gregos adotaram o alfabeto fenício e o mudaram com a introdução das vogais. Até o desenvolvimento do grego moderno ainda houve duas etapas: a helenística e depois a era do grego bizantino.
A pronúncia clássica e a moderna do grego diferem-se uma da outra. As graves alterações fonéticas que surgiram ao longos dos três milênios na língua não são visíveis na ortografia. Isso significa que as palavras gregas antigas e modernas são escritas muitas vezes idênticas ou muito semelhantes, mas a sua pronúncia é completamente diferente.
A língua grega mudou a sua pronúncia várias vezes ao longo dos últimos milênios. Graças aos esforços para a preservação da língua grega, a escrita grega não mudou quase nada. O alfabeto grego é uma continuação do desenvolvimento do alfabeto fenício. O alfabeto grego usado hoje é composto por 24 letras.
Letra | Nome (grego clássico) | Nome (grego moderno) | Transcrição (grego clássico) | Transcrição (grego moderno) |
---|---|---|---|---|
A, α | Alpha (ἄλφα) | álfa (άλφα) | a | a, αι=e |
B, β | Beta (βῆτα) | víta (βήτα) | b | v |
Γ, γ | Gamma (γάμμα) | gáma (γάμμα) | g | g, γγ=ng, γκ=ng, γχ=nch, γξ=nx |
Δ, δ | Delta (δέλτα) | délta (δέλτα) | d | d |
Ε, ε | Epsilon (ἔψιλον) | épsilon (έψιλον) | e | e, corta-se antes de ι |
Ζ, ζ | Zeta (ζῆτα) | zíta (ζήτα) | z | z |
Η, η | Eta (ἦτα) | íta (ήτα) | ē | i |
Θ, θ | Theta (θῆτα) | thíta (θήτα) | th | th |
Ι, ι | Iota (ἰῶτα) | ióta (ιώτα) | i | i |
Κ, κ | Kappa (κάππα) | kápa (κάππα) | k | k |
Λ, λ | Lambda (λάμβδα) | lámda (λάμδα) | l | l |
Μ, μ | My (μῦ) | mi (μι) | m | m |
Ν, ν | Ny (νῦ) | ni (νι) | n | n |
Ξ, ξ | Xi (ξῖ) | xi (ξι) | x | x |
Ο, ο | Omikron (ὄμικρον) | ómikron (όμικρον) | o | o, corta-se antes de ι |
Π, π | Pi (πῖ) | pi (πι) | p | p, μπ=mb |
Ρ, ρ | Rho (ῥῶ) | ro (ρω) | r(h) | r |
Σ, σ ou ς (no final da palavra) | Sigma (σίγμα) | sígma (σίγμα) | s | s |
Τ, τ | Tau (ταῦ) | taf (ταυ) | t | t, ντ=nd |
Υ, υ | Ypsilon (ὔψιλον) | ýpsilon (ύψιλον) | y | y, depois de vogais v ou f |
Φ, φ | Phi (φῖ) | fi (φι) | ph | f |
Χ, χ | Chi (χῖ) | chi (χι) | ch | ch |
Ψ, ψ | Psi (ψῖ) | psi (ψι) | ps | ps |
Ω, ω | Omega (ὠμέγα) | oméga (ωμέγα) | ō | o |
Até recentemente foram utilizados os acentos e símbolos para o som fricativo glotal átono no grego. Estes foram introduzidos no período helenístico da língua grega escrita. Em 1982, por um decreto do então presidente grego, este som foi abolido e os acentos foram substituídos por um único caractere que indica a sílaba tônica. Em textos gregos antigos os símbolos são naturalmente usados até hoje.
A coleção teologia
pública (Öffentliche Theologie) da editora alemã Evangelische Verlagsanstalt de
Leipzig, editada pelos destacados teólogos Heinrich Bedford-Strohm: e Wolfgang
Huber conta com um número que relaciona Karl Barth, cidadania e ética: a obra
de Alexander Massmann, intitulada Bürgerrecht im Himmel und auf Erden:
Karl Barths Ethik (Cidadania no céu e na terra: a ética de Karl
Barth, neste texto utiliza-se como referência a versão inglesa). A tese é de
que a ética barthiana resulta na compreensão da responsabilidade pública da
igreja levando a uma percepção politicamente ativa de justiça (MASSMANN, 2015,
p. xlii).
Nessa direção,
Massmann compreende que a ética barthiana, trata das formas práticas em que o
evangelho é afirmado de forma concreta, tal relação busca um “[...] labor ético
que permite uma transformação que seja crítica, criativa e construtiva”
(MASSMANN, 2015, p. xli). Ademais, “[...] como a relevância do evangelho não
pode ser separada de formas externas de vida, a igreja encara o desafio de como
formas particulares de correspondência prática ao evangelho podem ser advogadas
diante de um público mais amplo”. Contudo, essa relevância não deve ser
confundida com qualquer forma de monopolização do espaço público, nem mesmo
moral ou espiritual. De modo radical, a atuação pública da igreja cristã tem a
ver com a graça. “A principal razão para o novo ethos cristão, contudo, pode
ser descrita como gratidão” (MASSMANN, 2015, p. xlii).
Além destes
aspectos, a abordagem de Massmann reforça a compreensão de que a teologia barthiana
parte de uma perspectiva trinitária dentro da qual a cristologia desempenha um
papel decisivo, sendo que a ética cristã estaria voltada à conformação a Cristo
e sua cruz. Nessa direção, diante do que chama de “discipulado cruciforme” (“cruciform
discipleship”), e da noção de que é na humilhação que o filho de Deus é
ainda mais exaltado (MASSMANN, 2015, p. xlviii), se percebem dois movimentos
que, de certa forma, sumarizam o método teológico barthiano, a saber, analogia
fidei e dialética. A primeira estabelece sua base na precedência da
fé e do evangelho; a segunda é demonstrada na tensão paradoxal entre humilhação
e exaltação. Ambas chaves, contudo, retornam ao mesmo ponto de partida, a
saber, a compreensão da revelação por meio do que se reconhece como Palavra
de Deus, em sua base escriturística e, mais profundamente, em Jesus
Cristo. Também a ética tem a ver com este Cristo crucificado, na medida em que
a teologia da cruz instrui a prática do sacrifício e do arrependimento
(MASSMANN, 2015, p. 4). Elementos que, na vida pública, tem a ver com a
constante reflexão do humano sobre sua condição sob o pecado, bem como com sua
atuação em favor de outrem.
Massmann
desenvolve um caminho em que afirma repetidas vezes a precedência do evangelho,
elemento que conclui de sua análise de Evangelho e Lei e que
utiliza como chave hermenêutica em sua leitura da KD. De forma sintética,
portanto, compreende que a ação moral “empresta uma moldura prática à forma
como cristãos/ãs articulam seu engajamento com o evangelho. De fato, isto é o
que constitui a obrigação moral” (MASSMANN, 2015, p. 439). Tal compreensão da
ética, indica Massmann, poderia receber a crítica de ser excessivamente
eclesial e com pouca compatibilidade pública diante de um contexto pluralista.
Contudo, sua ênfase na justiça social, na responsabilidade pública da igreja, e
na tradução empírica do evangelho permitem a construção de pontes com o debate
público (MASSMANN, 2015, p. 446). Dessa forma, não apenas o evangelho aponta
para a ética, mas também as próprias questões vividas no espaço público podem
ser consideradas parábolas do Reino, na medida em que apontam
para a misericórdia de Deus em Jesus Cristo (MASSMANN, 2015, p. 447).
Assim, a criação
(KD III) enquanto base externa da aliança (KD II) torna-se espaço das
possibilidades contingentes que operam para o melhoramento da vida de forma
criativa por meio de ações responsáveis (MASSMANN, 2015, p. 459). Com efeito, a
ética barthiana encontra uma base marcadamente eclesiológica, isto é, falar de
teologia pública a partir de Barth, em última análise, é falar sobre a igreja
no espaço público, fato corroborado por suas célebres obras O cristão
na sociedade e Comunidade cristã e comunidade civil.
Massmann destaca a
constante atenção dedicada por Barth à relação responsável que a igreja deve
ter com o Estado civil e com a justiça social. “O aspecto da justiça social
recebe clara expressão na KD II/1”. Atenção especial deve ser dedicada aos
social e economicamente pobres, as viúvas e aos órfãos. Isto é, Barth recorre à
tradição bíblica que pode ser encontrada em textos legais, narrativos, cúlticos
e proféticos. Além de estar em consonância com a preocupação de Jesus com
aqueles e aquelas que vivem à margem da sociedade. O mesmo acento na justiça
social é também encontrado nas primeiras comunidades cristãs. “Tal dimensão
econômica e social da ação cristã reflete a prioridade do evangelho em relação
à lei, na medida em que a ação social corresponde à libertação por Deus [...]”
(MASSMANN, 2015, p. 468-469). De tal forma, pensa-se a igreja enquanto
comprometida com o estabelecimento de uma democracia constitucional, fomentando
justiça social e atuando na sociedade civil (MASSMANN, 2015, p. 471). Também o
papel da economia para a paz e justiça social são pensadas por Barth, em
especial a partir de suas elaborações sobre reconciliação e ética, sendo que a
questão econômica pode ser ambígua, cabe também aí a luta pela clarificação dos
efeitos políticos das escolhas econômicas (MASSMANN, 2015, p. 472-474).
A precedência do evangelho
indica também que toda a ação realizada provém de uma outra ação já feita, isto
é, para o/a cristão/ã a obra de Deus em Jesus Cristo já está realizada, diante
do que resta aguardar seu Senhor. Contudo, esta espera deve ser ativa. “A
realização de Deus em Cristo providencia orientação e motivação para uma ação
sóbria” (MASSMANN, 2015, p. 474).
O viés
pneumatológico barthiano tem a ver também com esta disposição do/a cristão/ã e
de sua comunidade de atuarem concretamente na vida pública. “Como o Espírito é
o Espírito de Cristo, cristãos/ãs justificados/as não são deixados com apenas
um ideal vago de amor, mas estarão ao lado daqueles que sistematicamente são
excluídos da sociedade”. Em virtude disso, “cristãos/ãs participarão das
dimensões estruturais da justiça legal e social”. A justificação operada por
Cristo na ressurreição, neste contexto, “constitui uma parte da
responsabilidade cristã por condições justas na sociedade, o que Barth
compreende tanto em termos de justiça social quanto de uma democracia
constitucional” (MASSMANN, 2015, p. 479).
A obra do
Espírito, portanto, envolve a igreja como um todo em relação com a sociedade,
no que pode ser compreendido como salvação em sua dimensão social. Aspecto
especialmente desenvolvido em O Espírito Santo e a edificação da
comunidade cristã (The Holy Spirit and the Upbuilding of the
Christian Community KD IV/2 §67). Além disso, o Espírito Santo aponta
para uma ação ampla de Deus no mundo sempre convidando e empoderando a
humanidade (MASSMANN, 2015, p. 479-480).
Em resumo, a
proposta de Massmann, a saber, de uma cidadania no céu e na terra,
conjuga a relação entre evangelho e ética. Isto é, compreende que existem
profundas implicações éticas na teologia barthiana. Contudo, sua ética nunca
está desligada do evangelho e, portanto, da ação de Jesus Cristo. Em virtude
disso, pensa que a igreja deve atuar no espaço público movida por algumas
convicções básicas de sua tradição teológica, em especial: o ministério de
Jesus que acontece em relação com marginalizados/as e excluídos/as de seu
contexto; e a atuação do Espírito Santo que atualiza as relações entre
evangelho e ética empoderando cristãos/ãs a agirem na sociedade. Com efeito,
Massmann pensa uma íntima relação entre cristologia, pneumatologia e
eclesiologia em que cristãos e cristãs são chamados a encarnarem a realidade em
que vivem de forma transformadora. Esta dimensão profética da tradição cristã,
rememorada por Massmann na opção pela ação junto ao pobre, a viúva, o órfão,
aos marginalizados/as e excluídos/as econômica e socialmente, é aspecto
constituinte de uma fala teológica que, presente no meio acadêmico, não seja
apenas tradução de conceitos teológicos, mas também apelo crítico em relação às
estruturas de poder instituídas no espaço público. O bem comum, em especial o
bem daqueles e daquelas que mais sofrem constitui-se aspecto decisivo na
construção de uma teologia pública coerente com a tradição bíblica e com a
ética barthiana.
Os estudos sobre
Karl Barth e teologia pública rareiam, possuem esparsa divisão temporal e não compartilham de uma
mesma conceituação de teologia pública. Contudo, há continuidades na forma com
que tratam de Barth. É ponto pacífico que se parta da atuação pública do
teólogo de Basileia, ao que se destaca sua reação ao nazismo e seu envolvimento
com a Bekennende Kirche (Igreja Confessante). Rasmusson, de
forma hábil, soma a esta biografia pública de Barth sua reação ao liberalismo
teológico que esteve relacionado com o apoio à política de guerra alemã já no contexto
da Primeira Grande Guerra, bem como a decepção de Barth com professores que
haviam sido importantes em sua formação e com quem mantinha uma relação de
amizade e às vezes até familiar, como no caso de Martin Rade.
É em virtude deste
contexto que Rasmusson destaca na teologia barthiana, seu forte cristocentrismo
e precedência da fé. Aspectos retomados por Thiemann como elementos importantes
para a teologia contemporânea, uma vez que determinariam onde estaria o
critério decisório na relação entre fé cristã e racionalidade moderna. Também
Massmann lê o complexo barthiano a partir da precedência do evangelho.
O acento na centralidade de Jesus Cristo para o fazer teológico está presente
de igual modo em Weaver que, ao pensar o contexto de pluralismos, entende que a
teologia cristã poderia usufruir desta fundamentação barthiana para o diálogo
inter-religioso.
Assim como
Rasmusson, Laubscher parte da noção barthiana de leitura da realidade como ela
é em Jesus Cristo. Assim, por ser a base da existência é que tudo o que existe
tem a ver com Cristo. Com isso, para Laubscher, a vida pública é aspecto
inerente ao pensamento teológico. Na esteira de Laubscher, Senokoane e
Kritzinger refletem sobre a realidade sul-africana, propondo uma releitura de
Barth como um clássico, mais especificamente as Tambacher Rede, e
destacam as noções de Cristo em nós e de comunidade cristã
aberta a todas as pessoas.
Além dos aspectos
barthianos, cabe também apontar para a pluralidade de compreensão dos autores
sobre teologia pública. Laubscher e os autores Senokoane e Kritzinger pensam o
público como o contexto sul-africano, tratando da relação entre teologia e
sociedade/política. Thiemann pensa o público como a relação entre teologia e
cultura. Weaver, por sua vez, tematiza a questão do pluralismo cultural e do
diálogo inter-religioso como assuntos de teologia pública. Rasmusson, investiga
a teologia de guerra alemã, principalmente representada pelos Deutsche
Christen, como uma teologia pública – diante dessas formas de elaboração teológica
cabe indicar uma perspectiva de contínua criticidade e auto-criticidade da
teologia (cf. ZEFERINO, 2020). A elaboração de Massmann, por sua vez, aloca a
teologia barthiana na relação com a cidadania por meio da recuperação de sua
ética enquanto engajada com as questões do espaço público por estar embasada no
evangelho.
A diversidade do
que se compreende por teologia pública nesses trabalhos corrobora a percepção
de uma polissemia terminológica, mesmo assim, ao se considerar as relações
entre teologia e espaço público e a necessidade de tradução da tradição cristã
para dentro dos debates da sociedade, nota-se na teologia barthiana, como
perspectiva confessional que vivida em sua profundidade se doa ao pensamento
público sobre o humano, a possibilidade de construção de uma teologia pública.
Uma antropologia barthiana como aquela ensejada pela ideia de um Cristo
em nós resulta numa encarnação na realidade humana de tal modo que o
próximo não seja invisibilizado. Além disso, a tarefa contínua de crítica e
auto-crítica teológica aliada a um senso histórico de luta contra as injustiças
também são elementos presentes na teologia de Karl Barth que podem ajudar a
pensar a condição humana nas bases de uma teologia pública.
[1] O texto aqui apresentado é uma versão revisada de material oriundo
de nosso tese doutoral intitulada Karl Barth e teologia pública: contribuições ao discurso
teológico público na relação entre clássicos teológicos e res publica no horizonte da teologia da cidadania (ZEFERINO, 2018).
BARTH, K. Dádiva e Louvor: ensaios teológicos de Karl Barth. ALTMANN, W. (Org.). São Leopoldo: Sinodal/EST, 2006.
BARTH, K. Introdução à Teologia Evangélica. São Leopoldo: Sinodal/EST, 2007.
GEFFRÉ, C. Como
fazer teologia hoje: hermenêutica teológica. São Paulo: Paulinas,
1989.
LAUBSCHER, M. On
reading Karl Barth in South Africa today: Karl Barth as public
theologian? HTS Teologiese Studies/Theological Studies, v. 63, n.
4, p. 1549-1564, 2007.
MASSMANN, A. Bürgerrecht
im Himmel und auf Erden: Karl Barths Ethik. Leipzig: Evangelische
Verlaganstalt, 2011.
MASSMANN, A. Citizenship
in Heaven and on Earth: Karl Barth’s Ethics. Minneapolis: Fortress Press,
2015.
RASMUSSON, A.
Church and Nation-State: Karl Barth and German public theology in the Early 20th Century. Die
Nederduitse Gereformeerde Teologiese Tydskrif/The Dutch Reformed Theological
Journal, v. 46, n. 3-4, p. 511-524, sept. and dec., 2005.
SENOKOANE, B.;
KRITZINGER, J. Tambach remixed: “Christians in South African society”. HTS
Teologiese Studies/Theological Studies. v. 63, n. 4, p. 1691-1716, 2007.
THIEMANN, R. Constructing
a Public Theology: The Church in a Pluralistic Culture. Louisville:
Westminster/John Knox Press, 1991.
TRACY, D. A
imaginação analógica: a teologia cristã e a cultura do
pluralismo. São Leopoldo: Editora UNISINOS, 2006.
WEAVER, A.
Parables of the Kingdom and Religious Plurality: with Barth and Yoder toward a
Nonresistant Public Theology. The Mennonite Quarterly Review. v.
72, p. 412-440, July, 1998.
ZEFERINO, J.
Cidadania e teologia pública: estado da discussão e enfoque na
criticidade. in SINNER, R.; ULRICH, C.; FORSTER, D. (Orgs.).
Teologia pública no Brasil e na África do Sul: um diálogo teológico-político.
São Leopoldo: Editora Sinodal, 2020, p. 65-85.
ZEFERINO, J. Deus
para além da religião: um ensaio teológico a partir de Karl Barth. Anais
do Congresso Internacional da Faculdades EST, São Leopoldo, v. 3, p.
187-193, 2016.
ZEFERINO, J. Karl Barth e teologia pública: contribuições ao discurso teológico público na relação entre clássicos teológicos e res publica no horizonte da teologia da cidadania. Tese (Doutorado em Teologia). Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Curitiba, 2018.
https://revistas.pucsp.br/index.php/culturateo/article/view/51826/41035
Allain Weaver,
teólogo menonita, concentra-se na relação entre cristãos/ãs e não cristãos/ãs
em um contexto de pluralismos. O autor se propõe a tratar a ideia de parábolas
do reino, presente na KD IV,3.1, em relação com o diálogo inter-religioso,
uma vez que se mostra cético à uma teologia pluralista em princípio e pretende
verificar em Barth a possibilidade de se desenvolver uma teologia que esteja
apta a receber impulsos não cristãos, mesmo sendo exclusivista. Novamente
destaca-se o pano de fundo cristocêntrico de Barth.
A este respeito,
desenvolve Weaver – “Enquanto o reino de Deus é Jesus
Cristo, as palavras humanas podem, pela graça de Deus, revelar o reino. ‘A una
verdadeira Palavra de Deus torna estas outras palavras verdadeiras’, explica
Barth”. Contudo, estas palavras são sempre provisórias (WEAVER, 1998, p. 425).
A ideia de parábolas do reino presentes na esfera secular,
assegura, para Barth, que não se coloquem limites à livre graça de Deus
(WEAVER, 1998, p. 426). A verdade presente nessas parábolas, por sua vez, é
julgada pelo fato de apontarem ou não para Jesus Cristo (WEAVER, 1998, p. 430).
Além disso, também são pensadas à luz de confissões e dogmas da igreja. “[...]
nesta esfera alguma novidade é possível. Parábolas seculares podem alargar e
preencher dogmas existentes na igreja e podem até mesmo provocar uma revisão
dogmática” (WEAVER, 1998, p. 431-432). Além disso, o fato de provocarem bons
frutos ou não também é critério para a assimilação ou não destas parábolas.
Ademais, “para que sejam parábolas do reino, elas devem ser ambos, conforto e
correção para a igreja”. Desta forma, “a igreja, em outras palavras, será
simultaneamente desafiada pelas parábolas seculares a arrepender-se de pecados
passados e a viver de acordo com seu chamado e será confirmada nele, i.e., em
sua submissão a seu Senhor, Jesus Cristo” (WEAVER, 1998, p. 432). Estas
palavras, em Barth, porém, servem em momentos específicos, particulares, não se
transformando em normas gerais para a igreja (WEAVER, 1998, p. 433).
Diante deste
quadro, Weaver argumenta que “[...] uma teologia barthiana das religiões
insistiria na humildade dos cristãos engajados em conversas com não cristãos,
além de uma disposição a empregarem rigorosa autocrítica à luz da Palavra de
Deus” (WEAVER, 1998, p. 434). Além disso, se poderia reconhecer que palavras e
ações de não cristãos podem ser compreendidas como aspectos da Palavra de Deus.
“Que o próprio Barth não tem feito esta aplicação não deveria impedir que
teólogos o façam hoje” (WEAVER, 1998, p. 435).
Quanto ao diálogo
entre as religiões em vistas de uma atuação pública na sociedade, Weaver prevê
um caminho mais plausível, a saber, que as diferentes religiões busquem em suas
tradições impulsos para esta atuação ética (WEAVER, 1998, p. 438). Para ele, a
teologia pública advinda de sua análise de Barth, cotejando também aspectos da
teologia de Yoder, seria “uma que testemunhasse ao mundo por meio de sua
existência corporativa enquanto simultaneamente recebesse palavras críticas do
mundo e (às vezes), nesta base, modificasse a forma de testemunho” (WEAVER,
1998, p. 439). Para Weaver, “uma abertura às parábolas seculares requer da
igreja a renúncia de orgulho e autossuficiência; em resumo, ela requer
não-resistência” (WEAVER, 1998, p. 439-440).
Weaver, ao receber
as elaborações barthianas no contexto do diálogo inter-religioso se mostra
bastante cético às tentativas de se encontrar um centro comum entre as
religiões que não as diferencie em seus específicos, uma vez que parte da ideia
barthiana da afirmação de Jesus Cristo como aquela grande diferença que
identifica a fé cristã. Sua argumentação, contudo, leva a um centro comum
cristão. Com efeito, o viés cristocêntrico barthiano não parece o mais adequado
para o diálogo entre as religiões, uma vez que, como o próprio Weaver relembra,
trata da abolição da ideia de religião por ser tentativa humana de chegar a
Deus, pois em Barth, o movimento primeiro é sempre de lá pra cá.
O viés da impossibilidade de se esgotar o mistério daquilo que historicamente
foi chamado de Deus parece mais apropriado ao contexto do diálogo entre as
religiões, aspecto que também está presente em Barth (ZEFERINO, 2016, p.
187-193). Lê-se Barth com e contra ele mesmo, uma vez que seu cristocentrismo,
apesar de bem sustentado e inclusive necessário em virtude de seu contexto
histórico, sufoca sua teologia a ponto de não permitir espaço para que circule
o ar movimentado que ele mesmo argumenta ser a força que
move o pensamento teológico (BARTH, 2007, p. 37-38). Não seria o Cristo
dogmatista (cf. GEFFRÉ, 1989) um empecilho prático ao seguimento mistagógico do
Jesus narrado pelos evangelhos? Apesar de preocupar-se com o rechaço do
triunfalismo cristão, Weaver parece, desde Barth, pautar-se em um triunfalismo
epistemológico ao invés de soteriológico.
A abordagem de
Martin Laubscher, desde o contexto sul-africano, investiga as possibilidades de
leitura de Barth com base na realidade pós-apartheid. Sua análise se ocupa com
o recorte temporal de 1945 a 1956 do corpus barthiano. Além
disso, o autor sul-africano também destaca a vida pública de Barth com seu
envolvimento político, seja no contexto da Segunda Grande Guerra, seja nos
debates acerca da tensão entre Leste e Oeste (LAUBSCHER, 2007, p. 1555), como
pontos de referência para pensar Barth como um teólogo público.
Na relação entre o
que chama de âmbitos espiritual e secular, Laubscher compreende que não há uma
separação radical entre eles, pelo contrário, Barth os veria sob o senhorio de
Jesus Cristo, sendo que o primeiro deveria atuar para dentro do segundo. Com
isso, o marcado cristocentrismo barthiano é tomado por Laubscher como base para
a relação da igreja com o mundo público. Laubscher percebe que, em Barth,
“[...] há uma íntima e próxima ligação entre o público e a teologia. De fato,
partindo da definida intenção pública que sua teologia possui, qualquer opção
forçada entre ambos seria falsa” (LAUBSCHER, 2007, p. 1556). Entretanto,
justamente em virtude de seu ponto de partida cristocêntrico, pontua Laubscher,
em Barth é importante que se distinga que a precedência está na centralidade de
Cristo (LAUBSCHER, 2007, p. 1557). Assim, Laubscher compreende que o pensamento
de Barth é teologia pública, mas sendo tanto teologia como pública em virtude
da centralidade de Jesus Cristo. O autor segue a argumentação da seguinte
maneira:
Desde
seu ponto de partida teológico – como a realidade é em
Cristo – ele não pode outra coisa senão estar interessado na vida pública.
Mais, a intenção da moldura teológica de Barth não é de uma teologia “para” a
vida pública, mas, antes, trata-se de pensamento que “é” teologia pública.
Barth não quer reduzir ou manipular a teologia “para” interesse público, mas vê
a teologia como sendo inerentemente pública. Portanto, ele também claramente
argumenta [...] pela necessidade de que cristãos deveriam participar da vida
pública de forma inconsciente e anônima [...]. A partir do momento que alguém
não é anônimo e inconsciente na vida pública, este alguém vê que o interesse e
a participação públicas se tornam um fim em si mesmos e que o teólogo torna-se
mais direcionado pelas questões públicas do que pela teologia na e em direção a
vida pública. Em suma, para Barth a marca teológica é primordial e definitiva,
apenas depois, a marca pública (LAUBSCHER, 2007, p. 1558).
Com efeito,
Laubscher identifica o pano de fundo cristocêntrico em Barth. Isto é
corroborado por vários outros autores e é uma das marcas mais definitivas e
reconhecidas no pensamento barthiano. Verificá-la como base para uma teologia
pública em Barth, contudo, é aspecto bem detectado pelo teólogo sul-africano.
Não poderia ser de outra maneira, o complexo barthiano é cristocêntrico,
evangélico e eclesial. Sua teologia pública não poderia ser diferente. Parte de
Deus para só depois enxergar o mundo. O que pode se questionar é justamente a
plausibilidade e adequabilidade deste ponto de partida diante dos distintos
públicos da teologia (cf. TRACY, 2006).
Senokoane e
Kritzinger, desde o contexto sul-africano, pensam as palestras de Barth em Tambach,
publicadas em 1919, que em português são encontradas sob o título O
cristão na sociedade (BARTH, 2006, p. 19-46). Pela fluidez do texto,
e por compreenderem que o estilo dialético utilizado por Barth neste texto é
similar àquele utilizado pelo teólogo suíço ao refletir sobre Mozart, os
autores a comparam com um movimento musical. O texto de Barth, para eles,
reflete uma forma de teologia que pensa a vida pública (SENOKOANE &
KRITZINGER, 2007, p. 1691-1693).
Cabe frisar que os
autores se ocupam da leitura de Barth entendendo-o como um clássico, resultado
de evento sediado na África do Sul intitulado Reading Karl Barth in
South Africa Today, como parte integrante de um projeto maior, a
saber, Reading the classics (SENOKOANE & KRITZINGER,
2007, p. 1693-1694). O folheto de divulgação deste evento, citam os autores,
afirma: “As ideias de certos teólogos permanecem relevantes e desafiadoras,
décadas e às vezes até séculos após suas mortes. Tais teólogos gradualmente se
tornam conhecidos como ‘clássicos’ que são relidos e recontextualizados diante
de situações sempre novas” (Reading the classics apud SENOKOANE
& KRITZINGER, 2007, p. 1694).
Os autores se
propõem a fazer um remix, isto sendo entendido como a atualização
de uma expressão artística, simultaneamente resguardando a integridade da obra
anterior, como contextualizando-a a novos espaços. Assim, eles buscam “remixar
a palestra de Barth em Tambach para a África do Sul atual de boa-fé, enquanto
sério exercício de recontextualização, explorando sua utilidade enquanto uma
teologia pública contemporânea” (SENOKOANE & KRITZINGER, 2007, p. 1694).
Os teólogos
sul-africanos compreendem teologia pública em sentido amplo, isto é, enquanto
intento interdisciplinar que pensa os aspectos públicos na direção do bem comum
(SENOKOANE & KRITZINGER, 2007, p. 1695). É neste sentido que eles leem
Barth e o relacionam com o contexto sul-africano em quatro pontos:
1. A partir da
noção barthiana de Cristo em nós, que para eles tem a ver com um
Deus que se faz presente na história, compreendem que há esperança também para
o contexto sul-africano, e esta esperança está baseada na própria pessoa de
Jesus Cristo. Assim, cristãos são chamados a participar do movimento de Deus na
sociedade (SENOKOANE & KRITZINGER, 2007, p. 1697-1698).
2. A noção
de Cristo em nós baseia a visão de uma comunidade cristã
aberta à todas as pessoas. Atestam, assim, “a necessidade de se desenvolver uma
nova cultura congregacional, na qual a igreja se torna a igreja que vive
enquanto a comunidade do abrangente reino de Deus”. Ademais, “uma teologia
pública, portanto, não começa por comunicados de imprensa ou pela crítica às
autoridades por suas falhas, mas pelas congregações locais que experienciam a
real presença do ‘Cristo em nós’ se tornando ‘edifícios abertos por todos os
lados’” (SENOKOANE & KRITZINGER, 2007, p. 1699).
3. O terceiro
ponto tem a ver com a compreensão/entendimento que os cristãos e a teologia
devem ter do contexto no qual estão inseridos. “Barth enfatiza que ‘os cristãos
na sociedade’ precisam entender a sociedade a seu redor”
(SENOKOANE & KRITZINGER, 2007, p. 1700). Esta forma de compreensão
contextual, para eles, não se trata de “um conhecimento abstrato, mas uma
inclusão engajada e comprometida de pessoas e situações”, além de “[...] fomentar
ações para transformação desta realidade no vindouro reino de Deus de paz e
justiça” (SENOKOANE & KRITZINGER, 2007, p. 1705).
4. Senokoane e
Kritzinger também enfocam a noção de perdão que, para Barth,
estaria carregada de uma força de transformação para a sociedade (SENOKOANE
& KRITZINGER, 2007, p. 1707).
Os autores se dedicam a ver como que
uma teologia pública de base barthiana pode lidar com temas candentes da
sociedade como a questão da pobreza. Este desenvolvimento teológico, mesmo não
tendo sido tratado por Barth em Tambach, merece atenção e carece de
interdisciplinaridade em virtude da complexidade da questão. Mas compreender o
contexto não é o suficiente, cabe “[...] fazer parte do Não de Deus ao mal,
sofrimento e opressão na sociedade”. Isto é, trata-se de pensar uma teologia
que promova um engajamento concreto na vida pública no horizonte da
transformação desta realidade (SENOKOANE & KRITZINGER, 2007, p. 1712).
Também Senokoane e
Kritzinger destacam a centralidade cristológica na obra barthiana, desta vez
por meio da noção de Cristo em nós. Contudo, o viés ético de sua
abordagem visibiliza uma cristologia mais dinâmica. Além disso, a proposta de
se ler Barth como um clássico, ensejada pelos teólogos sul-africanos, mostra
como que as teologias que se entendem como públicas hoje, podem haurir de
desenvolvimentos teológicos de outros contextos, seja por pontos de contato
entre distintas situações, seja pela perenidade de determinadas alegações.
https://revistas.pucsp.br/index.php/culturateo/article/view/51826/41035