No texto anterior estabelecemos o que chamamos axiomas, três deles, que passamos aqui a descrever, a fim de dar continuidade à nossa argumentação. Ah, sim, o assunto versa sobre a existência ou não de Deus. E os três axiomas se expressam como segue:
1. Afirmando que Deus exista ou que exista um Deus, vamos nos ocupar aqui com a suposição de que Ele é único: se está (ou se for) difícil provar a existência de, ao menos, um, imagina a de outros tantos.
2. Caso exista, só nos interessa (a nós e a toda a humanidade) um, ou melhor, Um que se comunique com o ser humano, porque não interessa a ninguém Um que não dê, literalmente, as caras, quer dizer, a cara (com todo o respeito).
3. Evidentemente, deve haver intermediários autorizados para falar em nome dEle, visto que essa comunicação, muito e necessariamente descomplicada, para efeito de sua relevância, precisa ser essencial, muito embora não deva ser tão informal assim, porém protocolar.
Resta, neste texto, continuando a argumentação, esclarecer o modo como se dá essa comunicação e por boca de quem. Porque, como já foi assinalado, alguém que saísse por aí dizendo "falei agorinha com o Altíssimo", seria tido como, no mínimo e antigamente se falava, "louco manso".
Para introduzirmos, portanto, esse item da argumentação sobre a modalidade de comunicação com o Altíssimo, será necessário mencionar a tão antiga e não menos conhecida, porém, atualmente, em vários graus desacreditada Escritura.
Também conhecida como Bíblia ou tradição (escrita) judaico-cristã, por incluir duas partes: Antigo e Novo Testamento, como denominam os cristãos. Lembrar que, pelo ramo do judaísmo, ela é denominada Tanakh que, na verdade, refere-se à uma abreviatura de suas três partes componentes, senão vejamos:
"T" de Torah, Lei; "N" de Naviim, Profetas; e "K" de Khtuvim, Escritos. Lembrar, ainda, que esta Tanakh é idêntica, em seu conteúdo, ao Antigo Testamento da Bíblia protestante porque, no Antigo Testamento da tradição católica, foram acrescentados mais 7 livros e ainda outros trechos em mais 2 livros, todos constantes na Septuaginta, esta a primeira versão, para a língua grega, feita a partir dos originais hebraico/aramaico dos textos, cerca de 250 a. C., em Alexandria, na diáspora, enquanto que a Tanakh judaica, herdada pelos protestantes, segue a tradição hebraica mais conservadora da Palestina.
Por que mencionar Escritura? Porque elas falam de um Deus. Ora, se vamos, em meio a esta humilde, porém não menos pretensiosa, argumentação falar da tentativa de provar que existe, pelo menos, um Deus, não começar a partir da citação exatamente do Deus de que falam as Escrituras seria omissão, o que produziria uma inutilidade argumentativa.
Não se pode avançar na tentativa de indicar outro deus sem admitir, na economia desta jornada, a possibilidade de existência desse indicado nas Escrituras. Portanto, não podemos avançar sem que, com todo o respeito, desautorizemos como Deus o próprio Deus das Escrituras (e, consequente e concomitantemente, as próprias Escrituras). Para só então partir, se for o caso, à demonstração de outro.
Mesmo porque a fama das Escrituras, exatamente por causa da sua divulgação secular, por que não dizer, milenar, torna famoso o Deus de que ela mesma se revela portadora, vide a história de religiões como o judaísmo e o cristianismo, este em seus variados ramos.
E, se a argumentação vai se direcionar, como já indicado, para uma expansão do axioma três, específico para se definir por quais meios o Deus hipotético se comunica, vamos introduzir aqui as Escrituras como uma possível fonte indicativa da possibilidade e, quem sabe, até dos meios pelos quais, efetivamente, se dá essa hipotética comunicação entre Deus e o ser humano.
Dizendo de uma outra forma: não se avança nessa jornada sem antes introduzir, em regra geral, a temática da comunicação com Deus como apresentada nas Escrituras. Supondo, então, ser necessário, de antemão, desacreditar seu conteúdo, no específico dessa possibilidade e, de uma vez, desacreditando ou desautoirizando como Deus esse que ela apresenta, caso seja uma falácia a possibilidade de comunicação com Ele.
E para terminar esta etapa, que já se revela extensa, mais uma vez queremos destacar o respeito necessário ao se tratar deste assunto. Porque, se para alguns, é tão fácil duas coisas: 1. desacreditar as Escrituras e, 2. obviamente, o Deus de quem elas falam, para outros todo esse assunto se revela de suma importância e, por razões óbvias, até sagrado.
Será necessária uma dissecação, vamos usar esse termo, das próprias Escrituras, visto que, em algumas partes, até como vício do ofício, elas falam com muita intimidade do Deus que apresentam em suas páginas. Porém, devido ao que podemos chamar de "evolução do pensamento humano", estudos, escolas, academias, enfim, o pessoal foi se desapegando de certas partes delas, corrigindo, vamos dizer assim, certos modos próprios delas se expressarem, indicando certas "falas" de Deus como disposições ou modos peculiares, literários, simbólicos, subordinados à época dos autores, enfim, "falas não-literais" do "Deus". Portanto, toda uma filtragem, segundo se alega, tornou-se necessária.
Resumindo, por incrível que pareça (e, por essa, ela não esperava), indiretamente a ciência é que vai dar a última palavra a respeito do grau de credibilidade das próprias Escrituras e ainda, não que ela, a ciência, tivesse procurado isso, vai acabar por definir se essas "falas" de Deus ou a respeito de Deus são mesmo como estão expressas, ou seja literais, figurativas, interpretativas, teológicas, enfim.
Mas essa discussão até onde ciência e "fé" avançam, encontram-se, repelem-se ou se autoexcluem, talvez, seja ou não seja o nosso objetivo aqui. Mas certamente, em alguns momentos, não poderemos avançar sem esbarrar e transpor esse obstáculo.
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