A Cascadura cheguei em 1966. Dorcas havia terminado o Curso Normal, em Nilópolis, e logo correria atrás de contratos. Era considerada uma "contratada" e não "efetivada". Para tanto, era necessária a oportunidade de um concurso e consequente aprovação. Esta, na vida de Dorcas, demoraria um pouco.
O marido que, a essa altura, já não mais pastoreava Japeri, insistiu com ela que, pense, trabalhando por contrato em Nilópolis, ia de segunda a sexta-feira. E no domingo também, à igreja. Memoráveis idas. Da Congregacional de Nilópolis seguíamos para a casa da avó Eunice, memoráveis e lautos almoços. Com a enorme família e as palhaçadas do Dante, depois de meu pai, o genro mais velho.
Cid argumentou que essa peregrinação a Nilópolis todos os dias, exceto aos sábados, não fazia muito sentido. Havia uma Igreja Congregacional de Cascadura bem ali pertinho. Era só caminhar até à Ernani Cardoso, atravessar e pegar um atalho por uma vila, ali bem ao lado da CTB - Companhia Telefônica Brasileira, ladeando uma horta que, começando ali nas faldas do Morro do Fubá, precisamente na João Romeiro, seguia descendo até Turiaçu, acompanhando o curso das torres de transmissão da Light.
Entrando na João Romeiro à direita, não davam 20 m e já se chegava à igreja. Achei muito gozado a semelhança entre os primos da família Jardim, filhos dos irmãos Henrique e Amaury, descendentes do Francisco Jardim que, há mais de 160 anos, veio ajudar Kalley, missionário pioneiro da pregação do evangelho em língua portuguesa, de modo permanente, no Brasil.
Tinham todos os quatro meninos, dois casais de filhos, por parte do hoje nonagenário Amaury Jardim, mais dois meninos e uma menina, por parte do hoje já com Jesus, pastor Henrique Jardim, corte de cabelo Príncipe Danilo. Eu achava muito engraçado, todos na moda corte militar, porque o pai dos quatro era da aeronáutica e o pai dos três da PM do Rio.
Época dourada, em função das atividades da Escola Dominical, da União de Juvenis, das idas ao Abrigo Evangélico da Pedra de Guaratiba, dos Acampamentos Ebenézer, agora nas dependências do Seminário Teológico Congregacional, também em Pedra de Guaratiba. Ainda extras, como o Coral dos Juvenis, regido por d. Arsylene, esposa do Henrique, e as sensacionais campanhas de pontualidade, presença e visitantes, da Escola Dominical, estas lideradas e idealizadas pelas duas esposas, Rute e Arsylene Jardim, respectivas dos irmãos Amaury e Henrique.
E as Campanhas de Missões? Cascadura foi responsável pela surpreendente arrancada missionária, a partir de 1972, trazendo com ela todo um grupo de igrejas que, despertadas para a relevância desse desafio, nesse período que antecipava o chamado Domingo de Missões, segundo em julho, alavancavam sempre ofertas recordes. Cascadura, pelo menos 5 anos seguidos, em primeiro lugar. Chegamos a cantar, nos famosos Lanches Missionários, no porãozinho do característico declive do terreno, o "Missionários cascadurenses/Nosso lema consiste em servir/Propalemos que somos crentes/Na esperança do eterno porvir", parceria inédita de Benodi e presbítero Jeconias. Como nos alegrávamos nesses dias! Como ofertávamos cheios de amor!
E a maior recreação de todas, os domingos de almoço nas respectivas casas dos Jardim, primeiramente em Quintino e, posteriormente, no Cachambi. Num desses domingos, com a família Jardim do pr. Henrique, eu, Luís Carlos e Carlos Henrique batíamos uma bolinha ali mesmo, na entrada daquele velho chão de quadrículas de concreto, garagem de frente do templo, exatamente no intervalo, sabem de que jogo? Da decisão Brasil X Itália, Copa do Mundo de 1970: assistimos à final numa TV, ali mesmo, no porãozinho. Inesquecível! Outra programação especial era aquela nas igrejas da 2ª Região, assim denominada a unidade administrativa da denominação congregacional (Bento Ribeiro, Encantado, Cavalcante, entre outras), participávamos de gincanas dos livros da Bíblia: Ester, Daniel, Rute, 1 Samuel. Era especial decorar aquela sequência de nomes dos eunucos do rei Assuero: Carsena, Setar, Admata, Társis, Meres, Marsena e Memucã.
Peças de Natal, Cultos ao Ar Livre numa rua de acesso à Fazenda da Bica, pela Pe. Telêmaco, os jogos de futebol de salão, fossem na quadra do CEFAP, em Guadalupe, ou no Corpo de Bombeiros do Campinho. Uma diversidade de atividades. Como era fantástico experimentar a agenda dessa igrejinha antiga, como diz a letra do hino do saudoso pr. Porto Filho.
Havia a Congregação de Magno, na antiga Vila das Torres, uma comunidade ao lado dessa já mencionada horta, espremida entre esta e a via férrea. Seu Guedes, como o chamávamos, era o responsável. E ainda, para os anos 60/70, numa tão pouco notável igreja do subúrbio, zona norte da cidade, tínhamos seu Walter, ora vejam só, harpista. Éramos acompanhados por esse requintado instrumento, ele, com as muito bem cuidadas, polidas e encompridadas unhas, cantávamos os hinos junto com o órgão de Naura, o bandolim do Azarias, homem dos sete instrumentos, também regente do Coral que, de quando em vez, aparecia com uma escaleta.
Lá adiante, adquirimos um piano, tocado por Damaris, filha mais velha do pr. Amaury, hoje pastora também, o próprio Azarias, Isis, a filha do pr. Henrique e, também inédito, naquela época, pr. Dilson que, com dificuldade de visão, pregava lendo braile, naqueles volumes enormes. Era (e ainda é) exímio pianista, treinado na mão esquerda num destacado acompanhamento, basta cantar duas primeiras linhas de qualquer música, será instantânea, por suas prodigiosas mãos, a harmonia.
Santa emulação, como menciona Paulo, proporcionada pela salutar equiparação dessas duas parcelas de um suave início de jornada cristã, de zero a 8 anos, na Congregacional de Nilópolis e, a partir daí, continuidade da infância, adolescência e juventude, em Cascadura. Todos que participaram desses anos jamais esquecerão esses personagens. No GP, como depois os adolescentes do tempo em que fui pastor apelidaram o Gabinete Pastoral, havia uma chamada Galeria de Heróis da Fé. Três retratos representavam todos esses outros heróis: Maria, Guedes e Adalberto.
Muito mais do que três. Muito mais do que trinta. Há pouco, foi encontrar-se com tantos outros d. Nilza, outra nonagenária, como pastor Amaury. Todos nós que testemunhamos esses dias carregamos essas marcas permanentes. E outros tantos, sem saber, são beneficiados por essa escola de fé que proporciona marcas abençoadoras em nossa jornada comum, assim como tem efeitos eternos.
Francisco de Souza Jardim,
companheiro do missionário
Robert Reid Kalley
Dorcas num dos passeios com sua turma,
dezembro de 1971.
Bem, esta foto é anterior a meu tempo:
ainda era chamada Congregação.
Agora já chegamos à década de 1970,
eu com o uniforme do coro dos juvenis.
Este aqui, com mais detalhes: d. Arsylene, regente;
na última fila, Francisco, eu, Jairo Freitas, rosto encoberto;
Roberto Silva, Paulo César, Luís Carlos (cortes
Príncipe Danilo) e a cabeça inconfundível
do Luís Carlos Silva; Marisa, Isis, Raquel, Jalmir Freitas;
Altamir, Carlos Henrique, Claudio e, só os sapatinhos,
Rosane Silva. O rosto sentado é do
presbítero Arlindo Freitas, com a esposa Gelta,
encoberta por detrás da regente.
Para quem não se lembra
do que é uma escaleta.
Rua Iguaíba, caminho para o local do
Culto ao Ar Livre, década de 1970.
Pe. Telêmaco 149, local do novo templo, Espaço da Paz,
Igreja Evangélica Congregacional de Cascadura
Linhas de transmissão da Light: curso da horta
que começava neste ponto. Ao lado esquerdo,
portão da antiga passagem por onde vinham
Dorcas e Cid Mauro, a partir da Ernani Cardoso.
Local atual da João Romeiro 212, vendo-se
um pedacinho da torrezinha de fachada do antigo templo.
Vila do antigo acesso, pela Ernani Cardoso, ao caminho que ladeava a horta
Local atual da antiga
estação telefônica da CTB.
Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças -
CEFAP, Guadalupe, local da quadra do futebol de salão.
Quartel do Corpo de Bombeiros do Campinho,
local dois das peladas de futebol de salão.
Boas lembranças misturadas com a tristeza de saber que esses tempos não voltam mais. Em breve serão nossos filhos a contar sobre nós.
ResponderExcluirBoa memória, meu amigo. Foi um tempo muito bom. Me traz a memória muitas coisas. Bom saber que continuamos a seguir nosso mestre, guia e amigo JESUS. Abraço.
ResponderExcluirBoas e eternas lembranças.
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