segunda-feira, 5 de novembro de 2018

Crônicas de uma vida IX - Igrejas

         E as igrejas? Praticamente, nasci nelas. Meu pai, desde 1957, pastoreou a Igreja Batista de Japeri. Dorcas que, desde que namoraram, já havia definido que nunca seria batista, era membro da Igreja Evangélica Congregacional, em Nilópolis, no templo antigo.

       Em 1966, pediram transferência, ela e a mãe, Eunice de Araujo Lima, para a Congregacional de Cascadura, na "igrejinha antiga" ali da Rua João Romeiro. Portando, primeira infância em Nilópolis, segunda, pré, adolescência, pós, juventude e depois, como pastor, até 1994, estivemos em Cascadura.

       Ali conheci, no início da década de 1970, Regina que, no final de 1986, tornou-se namorada, esposa a partir de 2 de janeiro de 1993, no Acre comigo, mais o casal de filhos dádiva de Deus, desde janeiro de 1995.

       Na Congregacional de Nilópolis dei o primeiro passo para Cristo, terminologia da época, em 1963, com seis anos incompletos. Pregava Ivan Espíndola de Ávila, que tinha o dom da oratória, desenhando diante dos ouvintes o cenário descrito no sermão.

      Lembro dele, não sei se nesse sermão mesmo de domingo à noite ou quando, certa vez, em Cascadura, desenhando diante da assistência os quase mil profetas de Baal, frente a Elias, os deboches deste, a dança desesperada daqueles e, momento do máximo suspense, o clímax da narrativa, o fogo descendente.

       Talvez neste, contudo, num dos sermões dele, mais exatamente, na Congregacional de Nilópolis, no templo antigo que, segundo Dorcas, que brincou nos alicerces e teve meu avô Baldomero Leal de Araujo como ajudante de obras, ali escorreguei do banco da igreja, em direção à frente, num apelo feito por Ivan Espíndola de Ávila.

       Quando o pregador disse olhem, gente, um menino, criança ainda aceitando a Jesus, Dorcas, assustada, olhos esbugalhados, creio que, naquela noite, num de seus vestidos brancos  colados ao corpo, estilo anos 1950, deu com seu filho à frente, atendendo ao apelo estilo evangelical.

      Quando Ávila começou o apelo, consultei Dorcas sobre aceitar. Ali, banco da frente, pois havia um espaço de saída para a porta lateral do templo, à esquerda, de frente para os bancos do Coral, encostadas à parede, também esquerda, virados para o lugar onde, descido do púlpito, o pregador procedia ao apelo.

        Ela apenas falou ao menino: "Isso não é brincadeira". Ora, desviei o olhar dela, mas sempre olhando acima, incomodado, acompanhado seu olhar, sentadinho ao lado. Ela, 33 anos, e eu, quase 6. Como ele insistisse, vendo já eu um rapaz que atendeu ao apelo, ele dizendo que não se delongaria, decidi que não perderia aquela oportunidade.

         Voltei os olhos a Dorcas. Caramba, puxa, ela estava, cabeça baixa, orando. Mas que hora para orar! Aflito, olhei à frente novamente. Ora, Ivan já havia dito que não mais demoraria, repetindo o apelo. Não perdi mais tempo. Saltei. Fui. Caminhei à frente, foi quando se deu o acontecido do susto de Dorcas, logo após a menção do pastor.

         Recebi um diploma onde aparece escrito por garranchos de pré-alfabetizado o meu nome, a data de 14 de abril de 1963 e o texto: "Sê fiel até a morte e dar-te-ei a coroa da vida", Ap 2:10. Li e comentei com Dorcas se seria capaz em assumir esse compromisso. Ela disse que sim, que não me preocupasse.

     Conferi com Cid, meu pai, quando lhe mostrei o "Diploma de Convertido". Argumentei que "até a morte" seria por demais remoto e me preocupavam os compromissos da vida adulta, entre eles servir ao exército e ter de defender a pátria numa guerra, tendo que matar o inimigo e, portanto, violar o "Não matarás", por consequência, tornando-me um infiel.

       Remota possibilidade, redarguiu Cid, meu pai. Insisti. O problema consistia em, por alguma razão, imposta por circunstâncias externas, tornar-me infiel. Cid disse que eu descartasse essa possibilidade, que eu nunca me tornaria infiel, pois mesmo que, ainda numa guerra, nessa situação seria lícito, defendendo a pátria, abater o inimigo.

      Não vou negar que a possiblidade de uma infidelidade qualquer ainda me incomodava. Mas descansei, pelo menos na hora. Havia ganho as congratulações e o abraço do pregador da noite. Recebera o Diploma. Entendera o significado de assumi-lo. Perturbara-me a probabilidade de, eventualmente, não cumprir o compromisso assumido. Estava mesmo convertido, deduzi.


Diploma de Novo Crente 
distribuído pelo conferencista 
e assinado por mim.

Templo atual da
Igreja Evangélica Congregacional
de Nilópolis

Atual templo da Igreja de Nova Vida
no local exato do antigo templo -
notar detalhes do muro preservados

Templo antigo: alguém
anotou a data da foto,
provavelmente minha avó Eunice

Nenhum comentário:

Postar um comentário