Morávamos em Cascadura, Rio, RJ. Num corredor. Lá no final, dobrando a esquerda, em “L”, ficava o “Mendaguiá” 90, ap 102, que era assim que, ainda tenro, eu pronunciava Mendes de Aguiar, rua onde nasci, em 6 de maio de 1957. Na verdade, nasci no HSE, abreviatura de Hospital dos Servidores do Estado, na Gamboa, carioca da gema.
Contava minha mãe que foi arriscado.
Fui o quarto parto, desde que casaram, em 29 de maio de 1954. E só vingou eu
mesmo. O anterior, Cid (sem o Mauro), havia nascido em 29 de fevereiro de 1956.
Meus pais o sepultaram em 12 de março de 1956: apenas 13 dias de vida. E, nesse
dia, Dorcas completava 26 anos de vida.
Foi um trauma. Ela contava, nessa
casa mesmo aí em Cascadura, chegavam amigos à noite para conhecer o menino.
Traziam presentinhos para ele, presentinhos para ela. Meu pai despistava, para
não chocar as pessoas. Minha avó materna Eunice, a “vó velhinha”, como minha
filha passou a chamar, a partir de 2002, foi esteio nesse período.
Lembro desse corredor, o mais atrás
que vai minha memória. Meus pais diziam que eu falava, em rudimentos de
linguagem, “Aiá, aiá”, que era “Passear, passear”, que eu queria, tendo ouvido
que esse som significava ganhar a rua no colo do Cid, meu pai. Comigo
transitava ali, pelas cercanias, até Madureira.
Caminhava até o final da rua, naquele
tempo, sem saída. Contornava um valão, certamente muito menos poluído, naquela
época. Íamos por ali, não existia ainda o Tem Tudo de Madureira. Caminhávamos
até a Igreja Católica. Entrávamos. Seja lá por que motivo, na cabeça do Cid. E
eu apreciava os santos ali por dentro distribuídos.
Em meu ainda parco vocabulário dizia “Neco,
neco”, traduzido quer dizer “boneco”, desejando levá-los para casa. Lembro que,
pelo menos uma vez, chorei, nesse intento, por chantagem emocional, contrariado
pela insensibilidade do pai em não me atender. Um padre, que naquele tempo
ainda usavam batina escura, tomou-me no colo para consolar-me.
Explicou que deveriam ficar ali.
Outras pessoas, que não somente nós dois, Cid e Cid Mauro, viriam também
vê-los. Devo ter olhado com espanto para a cara do paroquiano, mais ou menos
entendendo, toquei mais uma vez, guiado pela sua mão, o “Neco”, e quedei-me
convencido. Era esse um dos tours pelos quais meu pai me conduzia.
Mas voltando ao corredor, não esqueço
o dia. Talvez voltássemos da igreja ou de outra saída, alhures, sei lá, o casal
era visitadeiro. Portãozinho de madeira, à época, naquele tempo muito mais
extenso o corredor, do que é hoje, compreensível, para o mundo infantil. Um céu
enorme, acima de minha cabeça, muito mais estrelado do que hoje, pelo pouco de
luz que, nos idos dos anos 60, esboçava-se por Cascadura.
Devo
ter suposto que era momento de uma pergunta teológica. Eu queria saber do rolo
em me dizerem, os dois, pai e mãe, ser Jesus filho de Deus e, ao mesmo tempo,
de José. Afinal, era de Um ou do outro. Cid entrou pela fórmula “pai adotivo”, “pai
de criação”, bem, rudimentos de construções teológicas, digamos assim.
Era só para lembrar o corredor.
Rua Mendes de Aguiar, bem na esquina
com Ernani Cardoso
Casa da Matilde, à direita; portão acinzentado,
indica a entrada do corredor; portal térreo do sobrado,
entrada dianteira da casa de d. Olga.
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A Paróquia, quase
60 anos depois.
Amei!! Melhores histórias narradas pelo melhor pai! Te amo.
ResponderExcluirLinda filha, para seu deleite e de seu irmão. Beijos.
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