Entrevistamos, com exclusividade, Lucas, o Evangelista, autor dos dois opúsculos ao Excelentíssimo Teófilo. Segue uma síntese.
1. Bom dia. Desde já agradecemos sua colaboração. Reconhecemos sua sobrecarga. Sem mais perda de tempo, a gente gostaria de seguir com a entrevista.
Lucas: Bom dia. Muito grato pela deferência. Sempre à disposição. Muito me empolga falar sobre esses assuntos.
2. Sim, é claro (risos). Conforme antecipadamente combinamos, vamos selecionar alguns tópicos dos seus dois livros para, eventualmente, sempre que o Sr puder, a gente conversar sobre eles.
Lucas: Sim. Certo.
3. Para começar, selecionamos aquele trecho, meio polêmico, da escolha do apóstolo substituto de Judas, o Iscariotes, bem entendido. Dr, o senhor acha que houve precipitação na escolha desse apóstolo?
Lucas: (Risos). Bem, antes de mais nada, vamos esquecer o "doutor". Chame Lucas, irmão, enfim. Quanto à minha opinião, vocês que leram meus textos, já perceberam que sou muito discreto em emitir opiniões.
4. Certo, sim, percebemos. Mas a gente queria a opinião do Sr, porque, afinal, é a fonte mais próxima e esteve colhendo depoimentos. De repente, o Sr até ouviu uma opinião a mais entre eles, os apóstolos, sei lá.
Lucas: Vocês já perceberam que sou econômico em minhas afirmações. Como digo na introdução dos textos, procurei ser criterioso e investigar, cuidadosamente, escrevendo para inteirar o leitor a respeito dos fatos sobre Jesus e conduzi-los a crer, a ter "plena certeza", para citar eu mesmo (risos). Por isso não entro em conjecturas.
5. Certo. Mas essa questão de quem e quantos são os apóstolos é mesmo polêmica. Não se resolveu. E também como os apóstolos eram vistos, seu chamado individual, para falar assim, desde os dias de Jesus já gerava uma polêmica, pelo questionamento de sua autoridade.
Lucas: Sim, é verdade. Ora, até mesmo Paulo, com quem convivi de modo bem próximo, era questionando sobre sua autoridade. Para você ver como esse nosso pessoal é complicado: questionar autoridade, vocação e apostolado do próprio Paulo!
6. Pois é. Mas, afinal, Dr... desculpe, irmão Lucas, qual a sua opinião sobre esse assunto? O Sr diria que Paulo, então, completa o número dos doze? Ele seria o legítimo substituto de Judas?
Lucas: Não. Eu acho que a autoridade do chamado apostólico é exclusiva de Jesus. Ele chamou Paulo, daquele modo como descrevi. Ouvi dele várias vezes esse testemunho. Citava em suas pregações, em sua própria defesa, como indiquei nos Atos. Agora, com relação a quem é ou não apóstolo, acho que, a princípio, Jesus indicou e chamou os que ele mesmo quis. Depois, à medida que o tempo foi passando, generalizou-se entre os que receberam como dom essa bênção. Você já deve ter reparado como o próprio Barnabé, naturalmente, recebeu esse título. O que importa não é o título, como muitos pensam e buscam, até hoje, mas a bênção de ser enviado em nome de Jesus, para espalhar o evangelho do reino, que é o sentido do termo "apóstolo", enviar.
7. Então o Sr acha que ali, nesse relato registrado pelo Sr, daquela assembleia dos irmãos, entre a ascensão de Jesus e o Pentecostes, houve uma precipitação naquela escolha?
Lucas: Não diria "precipitação". A igreja reunida, aquele pequeno grupo de irmãos, estavam ainda sob impacto dos últimos acontecimentos. Agora se viam, definitivamente, e de novo, sem a presença de Jesus. Um trauma atrás do outro: traição de Judas, que caminhava com eles. Prisão e morte de Jesus. A ressurreição, sim, mas logo depois o anúncio de que Jesus não ficaria com eles. Então, tomaram essa iniciativa. Eu acho que a igreja, ali, estava treinando em tomar suas decisões, como ocorre até hoje. E vai ocorrer até à volta de Jesus.
8. Então, podemos dizer que a escolha, que recaiu sobre Matias, poderia sem nenhum problema recair também sobre o irmão José? E a escolha que fizeram não estaria, de certa forma, prejudicada, visto que mais tarde Jesus mesmo escolheu Paulo? E alguns dizem que foi porque o Pentecostes ainda não havia ocorrido e, por isso, não havia, ainda, autoridade dada pelo Espírito...
Lucas: Vamos com calma (risos). Uma coisa de cada vez. Não acho que o chamado de Paulo feito por Jesus, posteriormente, desautoriza a escolha de Matias. E Matias sendo escolhido, não quer dizer que o irmão José, o Justo, tenha deixado de ser apóstolo (risos). Apóstolos somos todos nós. A igreja toda é "apóstola". Quando Jesus disse "Ide", falou a toda a igreja. Ela, com seus dons, esforça-se em cumprir sua missão. Todos em conjunto, atentando ao que o apóstolo Paulo falou: "Procurem com zelo o seu próprio dom". O ide é para toda a igreja. E ela toda deve se sentir "apóstolo", quer dizer, chamada, vocacionada por Jesus. Ela cumpre o ide de Jesus, prega, discipula, batiza, envia, enfim.
9. O Sr mencionou Paulo. E ele diz, numa de suas cartas, se não me engano, aos Efésios, que um dos dons concedidos por Jesus é de apóstolo. O Sr acha, então, que há um outro sentido mais específico para esse apostolado?
Lucas: Olha, aqui eu me lembro das palavras do irmão Tiago, em sua epístola: "É melhor não se fazer de 'mestre', quando se sabe que a cobrança de Deus será maior". Correr atrás de títulos de liderança, é nocivo. Lembra, quando a mãe de Tiago, desta vez o irmão do apóstolo João, a mãe dos dois pediu um destaque para os filhos ao próprio Jesus? O que ele disse? Eles se dispõem a beber do mesmo cálice de provações que eu vou beber? E sabemos que beberam. O melhor, meu caro, é buscar a plenitude do Espírito, sem se preocupar com destaques de qualquer tipo. Nosso objetivo é ser como Jesus. Ser apóstolo como Jesus foi - no grego, quando Jesus diz que foi enviado pelo Pai, diz-se "apóstolo do Pai". E ser evangelista como Jesus foi. O irmão Marcos, em seu evangelho, diz que Jesus foi o primeiro evangelista, anunciando o evangelho do Reino, começando na Galileia. E ser profeta, e ser pastor, e ser Mestre como ele foi.
10. Qual seria, então, a definição específica que Paulo quis dar quando distinguiu, na epístola aos Efésios, os dons de "apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e mestres"?
Lucas: Olha, o Pentecoste representou "derramamento do Espírito". Ali acabou a distinção por grau, se é que um dia, no Reino de Deus, ela houve. Lembra do sermão de Pedro? Filhos e filhas, jovens, velhos, enfim, sem distinção, vão profetizar, sonhar, ter visões. Quer dizer que se, na época antes de Jesus, por acaso, tenha havido uma determinada classe, como a de profetas, no tempo do derramamento do Espírito, que é o tempo da igreja, essa autoridade e essa vocação se espalha a todos. Portanto, eu creio que profetas e apóstolos somos todos nós. Evangelistas, pastores e mestres são escolhidos, pelo Espírito, entre os irmãos, como ocorreu com Paulo e Barnabé, em Antioquia. Então, esses dons devem ser encarados mais como privilégio e bênção de atuar, no Reino de Deus, em nome e cheio da autoridade de Jesus, do que uma ideia de status entre os demais irmãos.
Muito grato. Agradecemos imensamente ao irmão sua disponibilidade. Sabemos de sua ocupação sempre intensa, tanto no Reino, como em sua dedicação à medicina. Que Deus continue a abençoar o irmão.
Lucas: Amém. Muito grato. É sempre muito bom falar sobre esses assuntos. São os meus prediletos (risos). Sempre ao dispor dos irmãos.
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