E foi assim. Um dos variados grupos que transitavam pelas cercanias do Templo era o grupo dos doze, agora acrescidos de Matias. Havia espaço livre, onde gentios e até mesmo mulheres poderiam circular.
As autoridades da guarda do Templo não admitiriam, mas aquela confusão gerada pela atitude do Mestre, naquela vez que dispersou os vendilhões, virando bancadas e espalhando seus produtos, alertou a guarda do Templo, saduceus, levitas e o staff do sacerdote para organizar melhor o acesso e os limites para circulação e acomodação nesses dias de festas.
Desde os tempos do Mestre, era facultado nos reunirmos nas varandas dos prédios das cercanias do Templo. Na verdade, era a Cidadela do Templo. Desde a época em que Davi tomou Jerusalém aos jebuseus, estabeleceu uma espécie de condomínio, onde sua Fortaleza, futuro Palácio onde Salomão moraria, após ampliá-lo, tornaram-se ligados ao Templo que ainda seria construído.
Herodes, o Grande, trabalhou por sua ampliação ainda mais, a partir da reconstrução iniciada por Esdras, transformando todo o conjunto na Fortaleza Antônia, com esse nome por causa do padrinho romano dele, Marco Antonio, o namorado de Cleópatra, aqui para o sul, no Egito.
Estávamos reunidos, como sempre fazíamos, cantando e conversando sobre os acontecimentos mais marcantes e relembrando as recomendações do Metsre. Ninguém nos incomodava. Também, para quê, se eles mesmos achavam que, tendo dado um fim ao nosso líder, com o tempo, todo o grupo se dissolveria.
Muitos outros haviam se levantado pensando ser alguma coisa ou alguém, repetiam isso. Esse tal de Jesus, diziam, era só mais um. Ali cantávamos, compartilhávamos testemunhos, líamos as Escrituras, sempre alguém trazia trechos delas, em retalhos de pergaminhos.
Nossos cânticos atraíam pessoas. À boca miúda falávamos de Jesus. Mas nada que fosse, assim, massivo. Ele havia nos recomendado que esperássemos o revestimento do Espirito Santo, a autoridade que, certamente, viria sobre nós.
Não sabíamos como seria. Mas estávamos aguardando. Com o coração fervendo, como diziam os discípulos de Emaús, quando tiveram aquele contato com o Mestre. Aliás, um deles estava ali conosco. Ora, não se perdia, por nada, aquele aglomerado de gente e de festa. Foi quando aconteceu.
Todos percebemos um ruído de vento, sem que estivesse ventando. Começamos a olhar uns para os outros. E também vimos rebrilhar, refulgir sobre nossas cabeças umas linguetas, como chamas de fogo. Ouvíamos esse som, avistávamos essas línguas de fogo, mas nem ventava e ninguém acendera qualquer candeeiro.
Então, fomos tomados de uma sensação que a todos envolveu, creio que todos entendendo que era um sinal de Deus, que se operava. Então, começamos dar glórias a Deus, em nossas próprias línguas, falando "aleluia, Deus seja louvado, glória a Deus, glória ao nome do Senhor".
E pessoas começaram a se aproximar à nossa volta. Entreolhavam-se, como nós, no início, curiosos de saber o que ocorria. Dividimos nossa atenção entre nós mesmos e eles, porque estávamos tomados de uma alegria ainda inexplicável, sem saber, afinal, totalmente, o que acontecia.
Foi quando as pessoas começaram a comentar que estávamos loucos. Não queríamos que se dispersassem. Algo nos dizia que era de Deus aquele sinal protético e que eles precisavam saber do que se tratava, tanto quanto nós, que não poderiam se dispersar sem saber. Por intuição, sabíamos que seria grande chance de testemunhar Jesus.
Foi quando Pedro percebeu, ou mesmo João comentou com ele, porque viviam sempre muito juntos, que houve duas coisas: primeiro, eles nos ouviam falar cada um deles, de modo diferente, em suas próprias línguas, os louvores que elevávamos a Deus.. E segundo, Pedro percebeu que eles, por não entender como isso era possível, já que eles sabiam que éramos, no máximo, palestinenses, na maioria galileus, não conheceríamos tanta variedade de idiomas, que se assustavam e iam acabar por se dispersar.
Foi quando Pedro interveio, pediu silêncio, dirigiu-se a eles e todos nós percebemos que era o próprio Espírito Santo dando a Pedro discernimento para compreender e esclarecer o que estava acontecendo. Quando ele começou a falar, todos nós e quem nos ouvia, começamos a perceber que a promessa de Jesus, sobre sermos revestidos do seu poder e recebermos autoridade para testemunhar dele estava se cumprindo ali mesmo e em todos nós.
E foi Pedro que tomou a palavra, fez calar a balbúrdia daquele povo, tomou da palavra e pregou. O Mestre estava certo, como sempre, quando indicou Pedro como nosso pastor. Ele pregou como nunca, esclareceu até para nós mesmos o que estava acontecendo. E fundamentou nas Estruturas. Não era um palpite. Era mesmo o sinal que Jesus mesmo havia dito que a gente esperasse.
O mais importante foi o sermão de Pedro. A palavra de Deus, pela primeira vez pregada por nós, para fora, para judeus e gentios ali presentes. Pela primeira vez anunciamos Jesus, como ele mesmo havia dito. Confrontamos as pessoas com os fatos e as Escrituras. Demonstramos que nada do que aconteceu a Jesus foi surpresa para o Pai.
Que o fato de ter sido morto, até isso estava previsto. Que a ressurreição também estava profetizada nas Escrituras, pela boca do rei Davi, nos Salmos. Támbem o derramamento do Espírito Santo, como foi predito pelo profeta Joel. E como era necessário que todos cressem. Muitos compreenderam. Perguntavam a Pedro o que fazer.
Pedro, então, falou que se arrependesem, confessando Jesus como seu salvador, para que fossem batizados e recebessem o Espírito Santo como dom. Vocês acreditam que até o final da festa batizamos mais de mil, gente, eu acho que muito mais, Mateus calculou quase três mil. Lembramos dos dias de João, o batista, que batizada no rio Jordão, em Elim.
Foi um susto para todos nós. O Mestre havia dito que anunciaríamos a palavra, batizando e ensinando, mas como saberíamos de fazer isso com tanta gente. Embora fossem, na sua maioria, patrícios, sim, em sua grande maioria vindos de lugares distante, da diáspora, assim mesmo tínhamos que explicar que a ênfase agora era Jesus.
O modo como tudo, nas Escrituras, apontava para ele. Como todo esse cerimonial mesmo do Templo tinha em Jesus seu cumprimento. De como o único e verdadeiro sacrifício válido pelo pecado foi o de Jesus, na cruz, e não bodes, novilhos e touros sacrificados mesmo naqueles dias de festa, o que ficou muito claro na pegação de Pedro.
Começávamos a entender a dureza do trabalho e toda a responsabilidade que haveríamos de realizar como igreja de Jesus. Era só o começo.
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