Uma certa nostalgia me invade. Saudades de meu pai. Ele usava essa sentença. Era o fim de toda a polêmica. Quando dizia assim, o que se tinha em vista era absolutamente dispensável. Por quê? Porque não tinha sentido prático.
Para ele, se valia não houvesse, era essa uma justificativa imediata, funcional e plena em resultado. Aplico essa mais-valia hoje e aqui ao sentido que muita gente faz do evangelho.
Não tem sentido prático. Não que meu pai aplicasse essa sentença ao evangelho. Jamais. Além de professá-lo, repassou-o a mim. E eu, já muito velho, pelo menos para tanto, quer dizer, para apostatar da fé, vou mantendo.
Mas na atualização dos dias, decorrer dos tempos, na época atual, vem sendo escamoteado, moldado às exigências deste século, ajustado às necessidades urgentes e imperiosas desta época.
Independentemente de perda de conteúdo. Evangelho é mensagem de salvação. Do quê? É urgente (ora, toda "salvação" é urgente)? É radical? Pertinente? Afinal, que sentido prático tem?
"Sentido prático" nesse contexto, acho eu, seria condicionar às exigências do que determina hoje o conjunto de prioridades do ser humano. Sentido prático. Vivemos uma época regida pelo prefixo grego "auto".
Autonomia. Autoconhecimento. Autoajuda. Autoimagem. A regência das prioridades está ao alcance do toque, do touch, do touchscreen. Ao alcance de um toque. Ponha esse evangelho na tela. E diga o seu valor agregado. Vou decidir se tem sentido prático.
Evangelho ajuda a compor a autoimagem. Associar a imagem pessoal ao sentido de um sacrifício, um sacrifício, vamos dizer assim, imenso, turbina a imagem de qualquer um. Seria, assim, um sentido subjetivo, imaterial, metafísico da existência.
Autoajuda. Ninguém será tão prepotente assim que se caracterize como autossuficiente. Mostrar-se, assim, frágil, em determinados momentos, chorar, inclusive, ensejar dependência física, emocional, sentimental, enfim, empresta à pessoal uma feição mais humana.
E os outros "auto", o que importa, é compreender que Deus está mesmo delivery, nessa fase da história da revelação, nessa dispensação, neste turno da economia das épocas. Deus a nosso serviço. E o evangelho como produto de prateleira de touchscreen, vai emoldurar a nossa imagem.
O evangelho, nessa sociedade consumista e imediatista, tem de demonstrar sua "autovalia", ou corre um risco: de não ter nenhum sentido prático. Prático para este tempo, para esta época, sua mais-valia, ora, seu valor agregado.
Talvez por tradição e costume. Era a fé dos avós. Por pura tradição, vale a pena. E também tem a ver com o grupo. Ora, projeção pessoal da personalidade no contexto do grupo, sempre terá algum valor (con)gregado.
Igreja também é uma coisa que carece de atualização. Na medida em que atualizamos o evangelho, que também atualizemos igreja. Ninguém aguenta. Bíblia, de si mesma, é outra coisa antiga. Deus, então, sem se fala. Se bem que, para falar de Deus, requer certos princípios.
Ele é eterno. Nem velho, nem novo. Mas as concepções a Seu respeito, é claro, necessitam atualização. Já caducam, junto comigo, as teologias. E precisamos de algo, vamos dizer assim, prático. As coisas precisam ter um sentido prático. Sob pena de se desatualizar no decorrer do tempo. E perdem sua mais-valia.
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