Jonas internou-se no porão. Porão de sua existência. Arriscou tudo nesse palpite. Ocorre uma borrasca no mar. O texto bíblico afirma que Deus provocou.
Precisamos falar sobre isto. Sou dos que acreditam que Deus não é uma inflexão dos teólogos. Religião pode ser um objeto de estudo científico. E teologia é uma ciência. Mas, para mim, ela deve partir da ação de Deus na história e não das suposições a respeito de Deus.
Quais as indicações da ação de Deus? A palavra de Deus é a principal indicação. Eu acredito na Bíblia como livro em que, como diz Pedro em sua carta, "homens falam da parte de Deus, movidos pelo Espírito Santo".
Uma vez que interditamos a Bíblia ou loteamos as partes que merecem credibilidade, manipulamos o que ela diz sobre Deus. Evidente que devemos focar o texto em seu tempo. Portanto, argumentação paulina, por exemplo, estruturada no modelo de raciocínio filosófico, terá abordagem diversa da narrativa vetero-testamentária de Jonas.
Quero dizer que acredito no argumento do texto que diz ser a tempestade ação de Deus, assim como a consequência dela, implicando a projeção de Jonas ao mar e o peixe deparado como livramento. Por que creio assim? Porque Deus. Não quero dizer que todos os absurdos podem der postos na conta corrente dele, como desfalques. Mas, sim, que ele é todo-poderoso.
Era Jonas e Deus. A tentativa de fuga. Mergulhou ao porão para dormir. Todas as superstições reunidas davam em Jonas. Procuraram e o acharam no seu porão, por reconhecê-lo o único indiferente a tudo a sua volta. Um dos sintomas da depressão do profeta.
Todas as religiões representadas invocavam seus deuses. Era um esforço ecumênico na tentativa de, por modo sobrenatural, quem sabe, último recurso, estancar a tempestade no mar. Jonas continuava alienado. Até que decidiram, para eles, um recurso mais isento e definitivo: sorteio.
Deu em Jonas. Era o azar do profeta. Em todo caso, interpelaram-no: por que todos, tendo cada um seu deus, invocam-no, exceto você? Como pode? Parecia, nesse gesto, que Jonas antecipava a observação de Jeremias séculos depois: vejo as nações mais apegadas a seus deuses, posto que não o sejam, do que Judá, no caso futuro de Jeremias, com Jonas, no caso atual, indiferente ao seu Deus.
Foram acordá-lo no porão. Jonas confessou sua fuga em relação ao seu Deus. Por serem mesmo supersticiosos, é que se chocaram com a sinceridade do profeta. E com a solução. Por seus escrúpulos, recusaram atender à sugestão do profeta: jogá-lo ao mar.
Mas a circunstância se impôs. Ou seja, Deus ganhou no cabo de guerra. Jonas deu-se por derrotado. Não podia, continuamente, fugir de Deus. Pensou que na morte poderia. Deus, em seus próprios desígnios, não se deixa surpreender. Jonas teve a covardia do salto ao mar. Deus tinha um peixe que engolisse o profeta.
O nome disso é milagre. Não dá para conceber um Deus sem eles. E também não dá para conceber um Deus que não escolha, por si, que milagres fazer. E não dá para conceber um Deus que não sai ao encalço, mesmo que fujamos dele, para nos abençoar.
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