quarta-feira, 20 de fevereiro de 2019

Artigos soltos 34

       
      Elas estão lá. Imponentes. Quem desce a partir da região serrana, coração do estado do Rio de Janeiro as depara. Serra dos Órgãos. 

     Assim chamaram os elevados que, tais quais tubos de órgãos de foles, projetam-se em direção aos céus. Testemunhas da história. 

      De sua própria história,  antes de qualquer outra. Assistiram à formação do próprio planeta. Diz que esquentou. Fundiu-se, muito provavelmente.  Resfriou.

    Até que pudessem brotar as capas de selva que as recobrem ou ainda florescem em seu sopé,  milhares,  talvez milhões de anos.  Testemunhas da formação do próprio planeta.

      Ao meu lado no ônibus vinha uma idosa. Talvez quase 20 anos ou pouco mais à minha frente. Ambos representamos a transitoriedade. Contornamos as rochas gigantes.

      O caminho da descida serpenteia entre elas. Uma delas assemelha com muita precisão um dedo que aponta o céu. Como um punho fechado de todos os outros dedos, exceto o indicador, apontando para cima.

     Dizendo, no gesto característico, por essa mão de pedra: Deus. Aponta para cima onde, hipoteticamente, Ele habita. Deus. O Dedo de Deus. Quem desencadeou todo o processo de, literalmente,  consolidação de tudo.

      Elas a tudo assistiram. Impassíveis. E nós transitórios. Ver-lhes o tamanho é fascinante. Pensar em subir-lhes o cimo é excitante. Fantasia. Como se, por um momento, vencêssemos.

      Vão nos assistir a passar pela história. Impassíveis. Indiferentes a nós. Mas testemunhas dos séculos e marcas da providência de Deus. Calos e cicatrizes na crosta do planeta. 

     As montanhas devem ter chegado antes dos mares e oceanos. Pelo menos, elas se alevantam para cima,  na crosta, seja no fundo dos oceanos,  seja da superfície adiante.

     Assistiram ao decorrer de milênios, milhões,  bilhões de anos. Precederam os vegetais. Precederam os animais. Precederam a formação do homem.

     Estão lá e a tudo assistem. Deve ser essa uma das razões dos homens em anelar vencê-las, até o cimo. Para de lá, talvez,  contemplar o que elas sempre contemplaram. 

     O tempo decorrido. Imagino se pudéssemos assistir ao filme a que assistiram. O homem também mira além universo, até recantos do espaço,  para ver se flagram, de novo,  esse suposto gênesis.

      Que segredos assim supostos guardam essas montanhas? Emergiram numa época remota, de grande convulsão no planeta. Cumpriram um processo contínuo e espontâneo do autor. Autor, com "A".

       A partir do nada, ninguém. A partir do nada, Alguém. A mais perfeita criação,  essa que ensinou tudo o que o homem estima conhecer. Esse homem que a si mesmo chama inventor, não passa de plagiador. 

     Aprende a partir do que encontrou feito. Imitou a natureza. Passou a imitá-la, para logo dizer: minha obra, assino embaixo. A Obra maior, não,  para ela não existe autor.  Pobre homem.  Sobe no cimo dos montes, permanecendo do mesmo tamanho. 
      

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