Salmo 5
Até aqui, já constatamos parentescos entre os Salmos 3, 4 e 5, a começar pelo fato de (1) ter sido escritos pelo mesmo autor, Davi, o rei-pastor-poeta, (2) serem, os três, orações e (3) ter como contexto a cercania de inimigos. Também, desde que, na história do 1º Livro de Samuel, este profeta-juiz-sacerdote se desloca até a casa de Jessé, em Belém, para ungir rei o filho caçula Davi que, por sua vez, o pai escondia, envergonhado, desde essa época Davi começou a granjear inveja, a começar pela própria família e, por aí afora, até a crise espoucar em meio ao trono, com Saul, sem motivo, regendo todo o desplante e fúria contra Davi, que passa a colecionar desafetos.
Neste Salmo ele ora, novamente, com a intensidade de um clamor e, desta vez, mede-se, como se houvesse um confronto entre ele e seus inimigos, não um confronto direto mas, na medida de caráter, no qual fica clara a diferença entre Davi, um servo de Deus, e os que não o são, ou assim não se reconhecem, ou se definem, diante de Deus. Aliás, falando em clamor, Davi se expressa haqishbha lecol shavhi: "Presta atenção à voz do meu clamor."
Clamor, traduzido, quer dizer "invocação", "grito", "súplica", o que não quer dizer que sempre seja necessário o grito, para que se caracterize "clamor". Por isso comento aqui que "clamor" mais se caracteriza como intensidade da súplica do que, propriamente, o volume do som. Ana, mãe de Samuel, por exemplo, na Tenda da Congregação, em Siló, na época do sacerdócio de Eli, sem dúvida, clamava em seu íntimo. Porém apenas balbuciava o que dizia, levando Eli a pensar que estivesse bêbeda, tal qual quando o embriagado mistura palavras ininteligíveis em seu delírio.
É usual vermos grupos de irmãos, quando reunidos, todos falarem ao mesmo tempo e em alto volume, caracterizando esse ato como "levantar um clamor". Caso queiram, que o façam, mas não está correto afirmar que somente essa modalidade representa "clamar". O clamor pode ser silencioso, como em Ana, pela intensidade do drama experimentado. Para Deus, evidentemente, ele consegue discernir tudo o que se diz e quantos dizem, se todos se puserem a falar ao mesmo tempo. Mas, para quem participa e os expectadores, fica confuso e quebra o princípio que Paulo prescreve na 1ª carta aos Coríntios, quando afirma que tudo o que grupos de cristãos fazem quando reunidos deve ser compreendido, para que não transpareça como loucura coletiva.
Nos versículos 1-3, Davi expressa o modo como se coloca diante de Deus em oração quando, por três modos diferentes, indica que, em sua oração, recorre ao Senhor:
QUANDO PALAVRAS DO SALMISTA O QUE PEDE A QUEM PEDE COMO PEDE
PEDE
v.1 A MINHAS PALAVRAS DÁ OUVIDOS SENHOR
MEDITAÇÃO MINHA ATENDE
v.2 VOZ DO CLAMOR MEU DÁ ATENÇÃO REI MEU
DEUS MEU POIS A TI ORAREI
v.3
PELA MANHÃ VOZ MINHA OUVIRÁS Ó SENHOR ME APRESENTAREI A TI
PELA MANHÃ E VIGIAREI
Pelo esquema apresentado, pode-se perceber o que, na poesia hebraica, denomina-se paralelismo, que é um reforço, por meio de linguagem sinonímica, do que vai expresso pelo salmista. No caso, ele chama de oração suas "palavras", seu "murmúrio"/"meditação", seu "clamor" ou, simplesmente, sua "voz". Pede a Deus que "dê ouvidos", "atenda", "dê atenção" ou "ouça". Refere-se a Deus como "Senhor", "Rei meu", "Deus meu" ou pelo vocativo "ó, Senhor". E, por fim, o salmista coloca-se diante de Deus "por oração", "apresenta-se" e põe-se como "vigilante" da resposta que vai obter.
continuação logo após o próximo texto...
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