Igrejas são uma ideia muito feliz. E muito inteligente também. Principalmente, vistas do ponto de vista o Autor, quer dizer, de quem teve a ideia e a chamou de Sua.
"Edificarei a minha igreja", ele disse. Se alguém pode imaginar algo contra essa ideia, contra o Autor dela e contra o povo que a compõe, Ele já antecipou a frustração dessa intenção contrária.
Dizendo: "Nem portas do inferno vão prevalecer contra ela". Eu vivo dentro delas desde ainda no ventre de Dorcas, minha mãe. Ela contava coisas do tempo de que a gente não lembra.
Na Congregacional de Nilópolis, trocava minhas fraldas por cima daqueles velhos e anatômicos bancos de madeira. Eram as de pano. Ela dizia procurar os últimos bancos, que era por duas razões:
Nunca (1) me (mal) acostumar a sair por qualquer coisa na hora dos cultos e que (2) ela mesma não perdesse nadinha desse mesmo culto. Nasci em 1957 e lá fiquei até 1966. Nela, em 1963, escorreguei desse mesmo banco, bem um ali no velho templo, que guarnecia a primeira fila da porta à esquerda, de saída lateral, fileira essa defronte ao coro, à esquerda, colado à parede, abaixo daquele magnífico janelão.
Acreditei no que dizia Ivan Espíndola de Ávila, o pregador da noite. Quando ele disse: "Olha, gente, um menino!". Dorcas que orava ao lado, arregalou olhos, pondo-os em mim. E o pastor me deu um "Diploma de Convertido".
Com a data 21 de abril de 1963, eu ia completar 6 em 6 de maio à frente. Sujeito a confirmações posteriores, acho que a conversão foi nesse dia. Nessa igreja ouvi os primeiros hinos, poesias, declamei a parábola do filho pródigo em cima de um banquinho.
Ouvi os solos de Jaíra e Marisa França Costa, duetos das irmãs Neusa e Jaíra, assisti ao Jovem Clarim, Nobel da época, teatro eclesiástico e eclético, dirigido por meu tio Dante Ssntos, num auditório, pro lados de Mesquita.
As marcas dessa primeira igreja são indeléveis. Esta palavra significa irremovíveis. Travessuras como no dia em que pulamos o janelão, para dentro da igreja já escura, mas com a mesa da Ceia recoberta, participar da Ceia proibida. Clandestinamente, seria deleite especial.
Furtamos dos pãezinhos (que representam o corpo) e do suco de uva (por sua vez, o sangue), eu, estabanado, deixei sobre a toalha ultra-branca um rastro do cálice que derramei. Foram logo me procurar. Suspeito número um.
Certo, ali também vivi essas injustiças. Colori imagens de historinhas de EBF - Escola Bíblica de Férias. Gravei na memória os hinos da versão antiga de Salmos & Hinos, assim como os rostos de uma geração há muito já em casa: Avelino Tavares, Carlos Costa, Manoel Araújo, entre outros e outras já em casa.
Dali saí para Cascadura. Nessa igreja da segunda infância, adolescência e pirmeiro pastorado, este surpreendente e inesperado, quando se olha da frente para diante. Nela fui batizado, cerquei-me de amigos em famílias que marcaram todas essas fases da vida e, mais surpreendente ainda, dela provém minha esposa, pode-se até dizer, algo previsível, num certo sentido.
Igrejas são a nossa cara. Há quem muito facilmente se descole delas. Outros, por suma simplificação e brutal equívoco do que elas representam, nunca entram, ou entram e não ficam. Eu estou até hoje.
Não me gabo disso. Mesmo porque se alguém diz que chegou ao grau máximo do que representa igreja, seu contexto e propósito, não entendeu ainda. É democrática, em sua concepção. Mas o acesso é restrito.
Não por quem cisma de fixar sua ortodoxia, embora isso ocorra, bloqueando o acesso. Mas por quem faz a escolha real dos que a ela verdadeiramente pertencem, que é Jesus Cristo, autor dessa ideia, de assim reunir as pessoas, e mantenedor de sua (dela) identidade.
Há diferença entre o que querem fazer dela, modernamente falando, igreja Fake, e o que a igreja representa, como ideia original. Há um risco permanente de que a ortodoxia, de orto, certo, e doxia, doutrina, se torne tão extrema e impositiva, como historicamente já ocorreu, chegando ao absurdo do que foi a "Santa" Inquisição.
Por outro lado, há o risco de que seja banalizada, descaracterizada, feita à imagem e semelhança dos que buscam acesso ou, inadvertidamente, apropriam-se da ideia. Ainda que, em última e definitiva forma, serão os congregados quem define o próprio perfil dela, seguindo as orientações da Bíblia, responsáveis pela compreensão que assumem.
Parece um beco sem saída: quem vai autenticá-la são os que podem se tornar responsáveis por corrompê-la. E não se pode abrir mão de uma ortodoxia, que um certo professor meu chamava de "disciplina da fé". Mas a própria Bíblia que o Espírito de Deus preside essa congregação. E acreditar nisso já se constitui pré-requisito.
Se a tua intenção é usar igreja como símbolo de status, desista, não entendeu nada. Jesus parte do princípio de que todos são iguais, tanto antes, como depois de O encontrarem e, por Ele, ter sido convertidos. Insuportável para todos os seres humanos se sentirem iguais.
Portanto, antes, todos iguais, em sua identidade deformada desde a queda narrada pela Bíblia, pecadores autênticos em Adão. Ao depois, pela cruz do mesmo Jesus, batizados em Sua morte e ressurreição, iguais em santidade diante de Deus.
Igreja é lugar de todos se sentirem iguais. Caem as máscaras. Por isso, tão insuportável para tantos. Por isso, uma catarse autêntica para o restante.
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