terça-feira, 22 de novembro de 2016

      Caro irmão Pastor Ezio:

      Quero me dirigir ao irmão. Desculpe-me usar este recurso.
Mas será um modo, digamos, silencioso e reservado.

      Tenho orado pelo irmão. Desde nosso encontro, meses atrás, quando estávamos combinando a possibilidade das aulas de hebraico, soube do estado de saúde de sua esposa.

     Pois  o irmão também deve ter conhecimento de que minha mãe, no período de 10/3 a 6/6 foi diagnosticada com essa mesma doença.

     Acompanhei, no hospital, no Rio de Janeiro, dia a dia sua luta. Também aprouve ao Senhor convocá-la para o local onde, agora, também se encontra sua amada esposa.

    Só mesmo reconhecermos que é verdadeiro que estão juntas, na presença do Pai, com Jesus, serve de consolo. Sabemos que elas cumpriram seu chamado, seu ministério e estão alegres, aguardando a ressurreição na vinda de Cristo, quando todos nos reencontraremos.

    Pensei muito no casal de filhos do irmão. Enquanto que vivi meus, até agora, 59 anos ao lado de minha mãe, mesmo residindo no Acre há 21 anos, seus filhos separaram-se ainda jovens de sua querida mamãe.

    Gostaria de deixar para eles uma palavra. A mãe deles e a minha tinham muito em comum. O amor delas e sua fidelidade ao ministério que receberam de Jesus. Caro Pastor, nos longos quase 2,5 meses que minha mãe esteve internada, com dificuldade de falar, imaginei quais teriam sido suas orações.

    Deve ter orado muito por mim e minha família. Pois sua esposa deve também ter orado muito pelo irmão e seus filhos. Em minhas orações de agradecimento a Deus pela vida de minha mãe, eu pedi e peço muito a Deus que me torne parecido com ela.

    Em três coisas: (1) no apego à Bíblia, pois ela era leitora assídua e constante; (2) na presença na igreja, que ela nunca abandonou e da qual nunca esteve longe, trabalhando incansavelmente, servindo aos irmãos, como a Dorcas (o nome dela) da Bíblia; (3) no cumprimento do ministério dado a ela pelo Senhor.

    Dedico, em nome de Jesus, em oração, a vida de vocês ao Senhor. Que junto com o consolo venha um desejo permanente de que vocês sejam fiéis, como diz a Palavra, "firmes, constantes e abundantes na obra do Senhor".

     Carreguem com vocês, permanentemente, a marca e o exemplo de sua esposa e mãe, assim como tenho pensado em, com minha vida, ter a mesma marca que minha amada mãe teve. E esse sentimento, como diz Paulo aos Filipenses, o desejo de, diante do Senhor, ser perfeito (Fp 3:12-16) nos acompanhe.

   Desse modo, honraremos Jesus, em primeiro lugar, mas também seguiremos as pegadas que essas duas grandes mulheres deixaram atrás de si. Grande abraço. Precisando, entre em contato. Conte conosco em oração. Deus fortaleça e abençoe sua casa.


quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Pastorais em Filipenses


   Como nasce uma igreja

   Como nasce uma igreja? Alguns aspectos são subjetivos, enquanto que outros são objetivos. Quando, em Atos, o autor se refere ao dilema de Paulo e seus companheiros, procurando lugar para onde ir, com gana e sede de pregar o evangelho, ele nos confronta com um aparente absurdo, ao afirmar que o Espírito Santo "impedia de anunciar a palava" ou "não permitia" definir-se um dado rumo, diante da opção de ir para ali ou acolá. Isto nos faz refletir sobre:

  1. uma igreja nasce da compulsão incontida para pregar o evangelho: a beleza e urgência do evangelho, a necessidade, já implícita em sua definição, de ser compartilhado deve ser o substrato que impulsiona o autêntico discípulo de Cristo. Este é o aspecto subjetivo.

  Ora, se, progressivamente, vem se perdendo a riqueza e profundidade, a simplicidade e autenticidade do evangelho, se sua transposição do seu livro-texto, a Bíblia, para a prática de seu compartilhamento, no face a face, com homens e mulheres tem se tornado raro ou distorcida a mensagem, colocada como acessório a outros interesses, nem pregação, resultado ou grupos que surgirem em função do que for compartilhado serão autêntica igreja de Cristo.

   2. uma igreja nasce de opção consciente na escolha de um lugar definido, onde as circunstâncias concorrerão para o sucesso final: comunidades surgem em torno de ações bem definidas de compartilhamento do evangelho, quando laços de comunhão se estabelecem e a relação entre os discípulos cumprem características bem definidas. Este é o aspecto objetivo.

  Em Atos, crentes perseguidos, ainda quando Saulo, segundo o autor, assolava a igreja, tagarelavam sobre o evangelho com quem encontrassem, mesmo em fuga. Paulo, nessa oportunidade, após viver a angústia por definir um lugar onde pregar e estabelecer uma comunidade, enfrenta uma série de dificuldades que, em outras circunstâncias, por exemplo, visto por ótica "racional", poderia parecer inapropriado insistir:

   (a) a cidade escolhida não tinha a sinagoga que, como agregadora de judeus e ponto obrigatório de estudo das Escrituras, facilitava a pregação e o acolhimento; (b) um grupo reunido na beira do rio se constituiu em referencial para o apóstolo; (c) uma jovem, numa estranha atitude de êxtase, diariamente acompanhava Paulo e Silas, despertando a atenção de todos para eles, porém de modo contraditório e negativo; (d) a repreensão de Paulo à mulher revela que era possuída por um espírito enganador; (e) a articulação da mulher com homens que a utilizavam como adivinha provoca a prisão dos dois missionários, por intriga junto às autoridades romanas; (f) Paulo e Silas são açoitados e presos, pondo-se a cantar na escuridão do cárcere, até que todo o quadro começa a reverter-se, por influência direta do poder de Deus.

  Essa foi a gênese de uma igreja, descrita em Atos 16:6-40. Algumas lições, no contexto geral, precisamos contabilizar, observando como Paulo e seus companheiros agiram, atentos ao resultado final, que se tratou da consolidação de uma das comunidades mais maduras e rica em frutos da história do Novo Testamento. Podemos concluir:

  1. Situações de extrema dificuldade, quando parece que todos os fatores são contrários à consolidação de uma comunidade, não se constituem em obstáculo que impeçam seu florescimento;
   2. O ponto de partida inicial para que uma comunidade se estabeleça é a compulsão que determinados obreiros garantem sentir e constatar, que os conduz a confirmar e impulsionar-se, com toda a certeza e garantia de que serão bem sucedidos;
   3. O compartilhamento do evangelho estabelece laços de amor entre aqueles que o compartilham: quem se propõe a fazer, traz consigo traços do amor de Deus, assim como se propõe a que outros experimentem esse mesmo amor e, uma vez estabelecidos esses laços, está lançado o alicerce de uma autêntica comunidade de Jesus, que o Novo Testamento denomina igreja.

   Vamos acompanhar como se deu em Filipos e os resultados práticos dessa história, espelhados nas páginas da Bíblia, no texto da carta aos Filipenses.

 


       

terça-feira, 15 de novembro de 2016

Diletante


    Lendo, puro diletantismo, Luiz Pondé e Schopenhauer, não necessariamente nesta ordem, acordei hoje meio filosófico. Provavelmente, por causa do tempo encoberto e frio.

    Resolvi, então, refletir sobre possíveis modos de confirmar que ou se Deus existe mesmo. Lembrei das Escrituras, uso da ferramenta e boca torta pelo uso do cachimbo, indo logo em direção ao específico da fé.

    O anônimo autor da carta aos Hebreus afirma "sem fé é impossível agradar a Deus". Quem dEle se aproxima, e aqui já está suposta Sua existência, deve crer que Ele exista, e se torna galardoador, e aqui, de modo simplista, o autor já supõe compensação ao crente, dos que O buscam.

    Fiquei só com a sentença "sem fé é impossível". E pensei se se pode afirmar que somente com ou mais especificamente se as Escrituras confirmam essa existência. Perguntando de outra forma, se fora das Escrituras, ou seja, supondo possível comprová-la, definitivamente, uma farsa, ainda assim se, fora dela, seria possível comprovar Deus ser existente.

   Ainda de outra forma a questão: crer em Deus depende exclusivamente das Escrituras? Refleti, então, na moderna, quer dizer, já faz mais de 100 anos, argumentação que põe em xeque trechos do Livro, ou dos livros da Bíblia.

   Comenta-se e comprova-se, diz-se, que tal(ais) ou qual(ais) autor(es) não escreveram esta ou aquela parte, o texto é ruim aqui e ali, tal ou qual texto não é tão antigo assim, discípulos de fulano e cicrano acrescentaram aqui e acolá, enfim, desgasta-se a tradicional credibilidade dos textos.

   E não mencionei, ainda, os erros históricos, segundo afirmam, e nem os disparatados "milagres", total e puramente anticientíficos, definitivamente postulam os preclaros doutores. A questão se reduz a uma pergunta: afinal, com o que sobra intacto e original, dá pra confirmar a existência de Deus?

   Sim, porque se der para confirmar, com o que sobra de autenticidade, até mesmo a questão se o Livro é ou apenas contém a "palavra de Deus" se torna irrelevante. Não interessa o quanto tem ou se tem total, o que sobra confirma a existência do Altíssimo.

   De um polo a outro, vamos ao Jesus histórico. Afinal, acharam-no? Caso tenha sido achado, foi ele um embuste? Uma fraude? Afinal, foi apenas um rabino meio louco e, definitivamente, foi Paulo, com a ajuda do pessoal que lhe deu continuidade histórica, que inventou o cristianismo?

   Se nem quanto à personalidade de Jesus conseguirmos obter, no texto bíblico, certezas, com relação às afirmações ali escorreitas, resta buscar argumento fora do Livro. Por ser diletante, como já preveni, refleti: ora, se somos fruto do acaso cósmico, provenientes do nada e em direção ao nada, novamente, eterno retorno, como diz Pondé, a razão também é uma variação sobre o nada.

   Ela nos dintingue dos demais animais. Muito embora, seja necessário dizer que, moralmente, somente o homem age de modo irracional. Voltando ao argumento, razão se torna não-saber, caso nossa origem e  destino seja o nada. Visto que conhecimento se torna múltiplas variações sobre tudo, sobre coisa nenhuma, conduzindo a lugar nenhum.

   Está a serviço do capitalismo e serve como instrumento de dominação: quem mais sabe, vende mais caro, ou se torna devedor, como no caso dos cientistas alemães feitos prisioneiros no projeto Manhattan, que dividiu as eras entre antes e depois da possibilidade de total aniquilação.

    Habitamos o centro de uma explosão ainda em curso, a Big Bang, os fótons são nossa origem e sua colisão pretende ser comprovada pelo LHC. Desesperadamente, procura-se vida fora do contexto terráqueo, algures, Universo afora. Caso não haja esse indício, perigosamente a humanidade se aproximaria da confirmação de que a vida no planeta seria mesmo resultado de uma ressaca do Altíssimo.

    Enquanto esperamos e, segundo Schopenhauer, vivemos, nessa existência, o nosso inferno, resta saber se Jesus falou mesmo aos judeus e, caso seja literal de Sua boca, se Ele pode bancar a afirmação "conhecereis a verdade e a verdade vos libertará".

     Caso esse homem tenha acertado e possa bancar essa afirmação, salva-se, a um só tempo, a razão e até se supõe uma existência para além desse inferno. Sim, porque ser liberto, porém retornar ao nada não seria honesto. Só vai nos restar, então, responder a pergunta de Pilatos: "Mas, o que é mesmo a verdade?".


domingo, 13 de novembro de 2016


     Três exortações de Paulo
 
     Pelo menos, três exortações Paulo faz aos em Filipenses: 1. Ter o sentimento de Cristo Jesus, 2:5: 2. Acautelar-se da falsa conversão, 3:2; 3. Ter em si a busca pela perfeição, 3:15.
       O sentimento de Cristo tem três características:
       A. Amplitude: Jesus o punha em tudo o que realizava. Andava por toda a parte fazendo o bem e curando todos os oprimidos do diabo impulsionado, em tudo o que fazia, por esse sentimento. Seria o amor?

      B. Originalidade: somente em Jesus existe esse sentimento. Só em Jesus existe e tem sua origem. Por sua vez, está em Deus que, antes mesmo que houvesse mundo, trazia consigo esse sentimento.

      C. Finalidade: existe para ser compartilhado. Nada que Deus tenha consigo e, por sua vez, concedeu ao Filho existe para ser retido. Tudo o que o Pai tem, é meu, disse Jesus. E disso o Espírito Santo recebe, para que possa compartilhar. E pela graça e de graça.

      Quanto à conversão, ela é perda total, troca de qualquer outra coisa pela sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus. Costumamos, de modo disfarçado, é claro, ter nojo do outro, repugnância ativa. É um disparate. O arrependimento verdadeiro nos coloca diante da rudeza do nosso pecado e nos aponta a cruz de Jesus.

      Imagine a gente se avaliando superior ao outro. Absurdo que, se não fosse trágico, seria ridículo. Deus se esvaziou de Si (o que teria para perder?) a fim de se identificar conosco. Deu-se, na cruz, para identificar-se conosco. A necessidade da morte de Jesus Cristo na cruz nos iguala a todos. Sem considerar o outro um igual, impossível a unidade.

      Precisamos  vital e desesperadamente do sangue de Cristo. Nisso, somos todos iguais, ou seja, pecadores perdidos e dispersos que, em Cristo, serão feitos um: unidade só possível em Jesus.

     Quanto a sermos perfeitos, o Espírito Santo pôs em nós esse anelo, do mortal ser absorvido pela vida, de ter a vida de Cristo oculta em Deus revelada no dia a dia.

      Paulo coloca como limite ser imitadores de Deus. É retórico? É impossível? Mas Ele opera em nós e o que, de nossa parte, é necessário na busca dessa perfeição?

     Vida piedosa. Vida com Deus, vida com a Bíblia, vida em comunidade, vida de oração, situações de amor ao outro, principalmente: amor é o cumprimento do ministério ou o cumprimento do ministério é o exercício do amor.

     Deus, no seu máximo, se fez homem. Perfeição é amar o Pai como Jesus amou e viver como Jesus viveu. O nome disso? Igreja.

segunda-feira, 7 de novembro de 2016


    Salmos notáveis (1).
    Salmo 1, anônimo, é considerado um salmo de sabedoria, muito provavelmente composto ou colocado porpositadamente como introdução a todo o saltério.
   Isso porque nos lembra a necessidade vital de ler e nos alimentarmos da Palavra, dia e noite. Mostra o livramento que isso significa para o crente, livrando-o de uma progressão faltal: andar, deter-se e sentar em meio a ímpios, pecadores e escarnecedores.
    A imagem central, das mais lindas da Bíblia, é comparar o justo a uma árvore bem plantada. Não se sabe se foi Jeremias o autor, em Jr 17:8, ou se este salmo é a fonte. Mas remete ao que Jesus diz em João 7:38 ou mesmo Ezequiel 47: rio de água viva ou torrente arrebatadora.
   Combina também com o fruto do Espírito em Gålatas 5:22: "árvore plantada junto a ribeiros de água, dando fruto a cada estação, cuja folhagem não murcha". Aqui está a verdadeira prosperidade, segundo ensina a Bíblia.

domingo, 6 de novembro de 2016

Artigos soltos 13


   Teologia de ocasião.

   Domingo, na chácara da igreja, dia de nossa escola dominical com crianças. Também nos reunimos para estudo bíblico com os adultos.

   O caseiro, Manoel, crente arguto e muito curioso da Bíblia, argumentou com um caso que ouviu, certa vez, em sua juventude. Travou conhecimento com uma moça que lhe contou sua história.

    Voltava, com duas colegas, as três em torno de 15 anos, da Lagoa Azul, um recanto em Porto Velho onde, segundo contou, caso caia uma agulha ao fundo, é possível enxergá-la, tão límpida é a água.

    Dois homens raptaram-na, pois as colegas alcançaram fugir e, por cerca de cinco horas abusaram dela. Na conversa posterior com esse nosso interlocutor justificava por que não acreditava em Deus: havia todo o tempo implorado livramento, sem que fosse atendida.

   Eis aí um problema teológico de difícil solução. Principal e objetivamente para a vítima. Pois o que esperava, de imediato e obviamente era que Deus evitasse ter sido ela seviciada por dois homens durante cerca de 5 horas.

   Portanto, não há o que especular, senão fazer algumas generalizações e, a partir delas, definir o futuro da teologia, a existência ou não de Deus e o que esperar de outras situações semelhantes.

   Primeira generalização: era de se esperar que, nesse caso e com relação a nenhum outro caso de estupros, Deus assistisse a tudo incólume. Portanto, não deveriam existir casos de estupros.

   Segunda generalização: ora, não deveria existir nenhuma maldade à qual Deus assistisse indiferente. Deus deveria pôr fim a todas e quaisquer maldades, por antecipação,  visto que não combina, pelo menos, com nossa opinião a respeito dele, que permita ou ainda assista a tudo impassivelmente.

    Terceira generalização: esta agora em tom de advertência. Por definição, devemos ter o cuidado de não atribuir a Deus maldade. Ele é essencialmente bom e possui bondade ativa, ou seja, disposto a reparti-la, porém sem obrigar a ninguém que seja aceita.

    Quarta (e última) generalização (por economia da paciência do leitor): liberdade e livre arbítrio são dotes com os quais Deus constituiu a raça humana, responsável e livre para agir, mesmo que de forma absolutamente reprovável, de extrema covardia e violência, como nesses casos.

    Não eram homens. E nem chamem de animais, porque esses não fazem isso. Porém, toda raça humana não pode ser avaliada por esse ato. Há muitos, por enquanto, penso eu, uma maioria de homens que repugna esses atos contra a mulher.

    Não podemos também avaliar Deus pela inatividade ao clamor dessa jovem. O caseiro esclareceu que um colega que ouvia a narrativa da moça, expondo as razões de seu descrédito da existência de Deus, contra-argumentou que, apesar de tudo e graças a Deus, ela estava viva.

   Bom, é discutível que ela queira mudar sua oração, expressando-se grata, Deus, apesar de estuprada, estou viva. Avaliei fraquíssimo o argumento porque, bem sabe Deus, em outros casos houve estupros seguidos de morte. Não amenizou o problema da moça e nem resolve nossa dúvida a respeito da indiferença divina quanto à maldade humana.

    Arrisco a quinta generalização: Romanos 5:15-21 explica como, por um gesto de um homem, Deus generaliza sua graça para todos os homens. Arrisco dizer que a resposta de Deus para todos os estupros é oferecer sua graça, tanto às vítimas, quanto aos agressores.

     Escandaloso admitir isso? Pior será pôr em Deus a culpa por todos os estupros, pela indiferença e, genericamente, todos os demais atos de maldade do ser humano. É melhor supor que Ele ainda concede ao homem liberdade de escolha, esperando que sempre escolha o bem e escolha ser bom.

     Difícil explicar isso à moça. Carregar a marca de um estupro deve, certamente, ser um dos maiores sofrimentos e cicatrizes da alma. O tempo se  torna remédio, mas a memória cobra seu preço. Qual seria, então, o remédio para a maldade humana?

   Tomara que Deus exista. Senão, não há remédio para a maldade humana. Será que a cura das cicatrizes de toda a maldade reside no perdão?

sexta-feira, 4 de novembro de 2016


      Altares de Abraão.
      Por que a Bíblia relata, destacando, altares que Abraão ia edificando, à medida que avançava em sua jornada na terra da promessa?
     Era média que fazia, com Deus, "jogando pra galera", hipocritamente, em função do que o Altíssimo lhe havia prometido?
     Era coisa demais: te engrandecerei o nome; abençoarei quem te abençoar e amaldiçoarei quem te amaldiçoar; em ti serão benditas todas as familias da terra, enfim.
     Seria sincero a cada altar erguido ou tratava-se de pura formalidade? Para que se erguem altares? Que atitudes, hoje, equivalem a caminhar erguendo altares?
      Altar erguido é estar certo de que a vida é culto vivo e permamente ao Senhor. Não se trata de lugar ou lugares de culto, mas ser culto ao Senhor.
      Se assim não for, absoluta incoerência. Deus precisa nos aceitar primeiro, antes de aceitar qualquer manifestação de culto, como foi no caso de Abel. Deus rejeitou Caim e, consequentemente, sua oferta.
      Não é que rejeitou, mas a Bíblia registra que houve proposta direta de Deus a ele que se convertesse ao Senhor, prontamente rejeitada. E quanto a Abraão, considerado o pai da fé, mesmo erguendo altares, mostra-se vacilante em algumas circunstâncias.
      Vacilação, medo, mentira, carnalidade, covardia e até mesmo dúvida, vejam só, enfim, pecado fazia parte integrante da vida do Patriarca.
     Por isso altares eram erguidos com pedras toscas, sobre as quais sangue escorria e fogo consumia o redenho da oferta. Pedras toscas simbolizavam a vida do ofertante, o sangue da vítima sem mácula, a necessidade de remissão dos pecados e a queima total, o holocausto de fogo era porque a vida toda se consome na oferta assim como na remissão.
      Quem ergue sua vida em altar permanente ao Senhor carrega consigo, pelo menos, essa tríplice consciência: segue sendo tosco e falho, como foi Abraão, traz consigo também a marca do sangue da vítima derramado pelo pecado, garantindo a remissão da culpa e, assim como foi dada vida por vida, a vida de Cristo pela vida do pecador, a queima da vida no altar é total.
       Trata-se de perda total, como bem entendeu Paulo em sua carta aos Filipenses: o que para mim, algum dia, foi ganho, isso considero como perda, por causa da sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus, em nome de quem perdi todas as coisas e as considero como refugo, lixo, para ganhar Cristo, sem ter em mim mesmo justiça própria.
       Somos pedras toscas, cujo amontoado se ergue em altar ambulante ao Senhor, na medida em que, lavadas pelo sangue de Jesus derramado na cruz se tornam edifício dedicado ao Senhor, para presença e habitação dEle, permanentes.
      Somos altar ambulante, somos corpo de culto permanente, somos marca e presença de Deus por onde vamos, sempre, em nome de Deus falando reconciliem-se com Deus. Tempo da oportunidade, o agora da salvação, tempo sobremodo oportuno, tempo da salvação.
       Deus quer caminhar nas tuas pegadas.

Mal traçadas linhas 36


     Cordeiro de Deus

      O estrangeiro, Abrão, seu nome, chegou por aquelas terras, despertando curiosidade e certo receio. Era muita gente com ele: rebanhos, provisões, esposas na caravana, enfim, pareceu mesmo que escolhia canto onde ficar.

     Era estranho. Na religião, por exemplo. Escolhia de seu rebanho o melhor ovino, de marca, e eventualmente o sacrificava num altar improvisado, um amontoado de pedras mal escolhidas, improvisadamente encaixadas umas às outras.

     Dispunha a rês. Retirava dela o que, queimado pelo fogo, poderia render mau cheiro. O aroma que subisse tinha de ser suave e agradável. Viam de longe a fumaça da queima elevar-se ao céu.

     Quem depois assuntasse as cercanias do altar, encontraria abandonado. Não que fosse santo o lugar, porque o homem era peregrino e não estabelecia santuários. Santo deveria ser o ofertante e a oferta, símbolo desse fundamento.

    Estranho aquele estrangeiro. Não carregava consigo nenhuma imagem de seu deus. Quando interpelado, dizia que seu deus era Deus. Aquele que criou céus, terra, águas de cima, de debaixo da terra e o próprio homem e mulher a sua imagem, à imagem de Deus os criou, homem e mulher os criou.

    Certa vez retirou-se, sozinho, com o filho considerado único que tanto esperara ver nascido. Era cedo, pela manhã. Somente os três, ele, seu filho e um servo souberam o rumo. A certa altura, ficou o servo e seguiram pai e filho. Daquela vez, ele ia sacrificar, sim, novamente, mas não escolhera o novilho.

    O menino perguntou, pai, e a oferta? Deus proverá para si, repondeu o pai. Cordeiro de Deus. Jesus disse que João era o maior entre os profetas, porque apontou Jesus e afirmou é o Cordeiro de Deus.

    Nenhum sangue de nenhum animal, diante de Deus, lava, limpa, purifica do pecado. A não ser o sangue do Cordeiro de Deus. Estranho aquele homem. Era um peregrino que, por meio de seu despojado ritual, profetizava a vinda do Messias, do Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo.

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Pastorais 4


       Denominação

       Não posso deixar de abordar o assunto que, aqui, tem função de definição pessoal do que acho que seja, experiência própria vivida já há mais de 50 anos e, como não poderia deixar de ser, provocação a que outros revisem sua própria experiência e visão específicas.

       Não serei acadêmico, visto não ser o meu forte. Tentativa em buscar esse viés, sempre expõe a respostas dentro do mesmo contexto, no qual não sou perito. Aprovo, reconheço a relevância e sou admirador do método. Só isso. Por isso, sigo, empiricamente falando.

       Minha experiência denominacional inicia-se com os pais, mais acentuadamente a mãe. Os dois introduziram-me na leitura e contação de histórias bíblicas e na rotina de ida à igreja, dominical, rotineira e dedicadamente.

      Estabeleceu-se o conflito, herdado dos tempos de namoro, porque o pai era pastor batista e a mãe congregacional. Já prevenira ao seminarista que nunca seria batista, mesmo que ele se tornasse pastor. Cumpriu o que prometeu, até o dia de sua (dos dois) morte.

       O pai ainda tentou ser congregacional. Mas, acidente histórico típico do congregacionalismo brasileiro, que se desdobra ao longo da história, talvez a partir de 1913, com a institucionalização, intrigas pastorais forçaram a saída do Cid da "seara congregacional", palavras dele. Mas esse, "intrigas pastorais", já é assunto acadêmico, que deixo aos entendidos.

        Ponto um, de três: denominação, para mim, começou em casa, passou pela Escola Dominical, em Nilópolis, até 1963, e Cascadura, até 1983, daí para a frente fui pastor ali por 11 anos, antes de vir para o Acre, onde estou até hoje.

       Ponto dois, idade da razão, pode ser contada a partir de uma visão, ainda romântica, de seminário. Cheguei lá aos 21 anos, em 1978, terminei o curso em 1981 e me deixei, com muita relutância, ordenar pastor em 1983. Como agora sou um deles, recorro, academicamente, à declaração de Zagalo, em cadeia nacional: "vão ter que me engolir", mesmo porque, agora, serei julgado, no juízo final, como um deles.

       Então, empiricamente, denominação, para mim, na idade da razão, significa uma postura patoral assumida com relutância, escrita por 5 anos de pastorado em Curicica, 1983-1988, 11 anos em Cascadura, 1983-1994, três anos em Copacabana, 1992-1994 e no Acre, de 1995-2016.

       Em terceiro, o tempo que resta. É claro que a soma dos anos permite formar uma ideia do que significa denominação. No somatório, defino que a ideia é excelente, boa e bíblica: (1) relacionamento entre igrejas locais, esforço missionário e assistencial, Paulo já recomendava; (2) compatilhamento de doutrina, troca de experiências com o texto das Escrituras, as citações dos Bereanos, dos tessalonicenses e de Ladioceia e Colossos bem fundamentam; (3) preparo de obreiros, as cartas a Timóteo e as recomendações a Tito deixam claro a urgência e necessidade de cuidar dessa função: aliás, a definição do perfil de Timóteo em Filipenses 2 confirma a necessidade de bons obreiros.

       A institucionalização é uma exigência da modernidade. Nesse recurso do tempo e da época, correm-se os riscos do século: herança autoritária da história brasileira, que implica anulação da opinião do outro, quando não condiz com o requerido, e a consequente disputa por poder, quando, então, os fins justificam os meios: anulam-se os princípios bíblicos do congregacionalismo.

      Por que acredito em denominação? Porque é uma boa (e bíblica) ideia. Por que ocorrem desgastes que, às vezes, percorrem toda uma geração e não se solucionam, apenas são esquecidos na morte dos atores? Porque nós somos esses atores e isso se chama Brasil. Mas o que, no nosso caso, a vivência com a Bíblia pode propor como solução?

Patorais 3

   
       Preâmbulos

        Se a proposta é debruçar-se sobre tema ou temas seletivos, escolhidos para debate inteligente, produtivo e profícuo, alguns pré-requisitos são indispensáveis. Destaco três, de novo, por simpatia ao algarismo e economia de energia. Bandeira amarela, segundo a Eletrobrás.

       A idade conta muito. Alcançar coração sábio, como diz o Livro, aprender a contar os dias é essencial. E não adianta lutar contra o fato de que somos resultado acabado, até aqui, pelo menos, desses dias. Sujeitos de 60, como eu, garotos de 35, enfim, têm visão diferenciada. O consenso final requer sabedoria.

       Então, se vamos nos debruçar sobre uma dada temática, "olho na missa, outro no padre": não podemos deixar de pensar no método a utilizar, um que ponha freio e limitações à mistura do que somos com a abordagem a ser feita. Isso é um pouquinho do que significa método científico.

      Segundo, é compreender que, no nosso caso, um fator externo sempre se configura, que é a ação do Espírito e a prevalência das Escrituras. Quase que retornamos à estaca zero, como dizia meu pai, porque cada um tem uma ideia diferente, tanto das Escrituras, quanto da ação de Deus, por meio do Espírito.

      Este é um dado relevante na concepção bíblica de igreja. Agimos, falamos e vivemos, como se Deus falasse, vivesse e agissse em nós, no linguajar paulino, e tudo isso em função do outro. Podemos encarar  isso como uma definição de Reino, da ação de Deus na história e do que é ser igreja.

     Então, um certo esvaziamento será necessário. Como Deus, que soube do que abrir mão, para ser o homem Jesus. Acabou dando certo: ele se fez Cristo, encarnação humana do evangelho, do Reino e do que é ser igreja. Isso é o que estamos buscando, com todo o coeficiente de objetividade e subjetividade contido nesse dado.

     Por último, como diz a Bíblia, andar de acordo com o que já alcançamos. Este terceiro ponto acaba remetendo, de novo, ao primeiro, porque nos manda rever nossa tradição. Temos raízes e âncora históricas e tentativas que se desdobram e nos encontram no contexto de nossos ministérios atuais. De certa foma, então, buscamos continuidade, porém desejando renovar modelos desgastados com e pelo tempo.

      Porém, devemos ser cuidadosos em reconhecer o que, de antigo ou tradicional, refugar. Há elementos genuínos e autênticos na tradição do que se foi que precisam ser renovados em nossa experiência. Jesus foi exemplo de busca do novo e reedição do antigo, porque era modelo definitivo, que nunca deveria ter sido esquecido ou alterado.

       Alguns desses modelos tradicionais fazem parte da definição de missão, do que é Reino e do que significa ser igreja. Algumas (ou muitas) boas ideias dos antigos, talvez nem postas em prática, são exatamente elas que devemos retomar. Na efetiva metodologia do Reino, essa mistura, do antigo com o que se renova, sempre ocorre.

        Façamos escolha certa, levando em conta que, o que somos, no contexto da história que escrevemos e dentro do tempo que nos resta, com essa qualidade de gente Deus quer agir, em nós e por meio de nós. Faz parte da definição.