quarta-feira, 20 de abril de 2022

  KARL BARTH: UMA INTRODUÇÃO Á SUA       CARREIRA E AOS PRINCIPAIS TEMAS DE SUA                     TEOLOGIA - Franklin Ferreira

  A Die Kirchliche Dogmatik buscou ser expressão da fé da igreja, e não de uma escola teológica particular. Ele eliminou “todos os elementos de filosofia existencial que então [nos tempos da Dogmática Cristã] pensava que devia fazer intervir para fundamentar, apoiar e até justificar a teologia”. A analogia fidei (ou analogia gratiae ou analogia revelationis) e a concentração cristológica – dois traços que caracterizam a Die Kirchliche Dogmatik – obedecem a esse critério de insistência de rigor absoluto, pois, para Barth, uma dogmática cristã deve ser cristológica em sua estrutura fundamental como em todas as suas partes, se é verdade que o seu único critério é a Palavra de Deus revelada e atestada pela Sagrada Escritura e pregada pela Igreja e se é verdade que esta Palavra de Deus revelada se identifica com Jesus Cristo. (...) A cristologia deve ocupar todo o espaço na teologia… quer dizer, em todos os domínios da dogmática e da eclesiologia… A dogmática deve ser em seu fundamento mesmo uma cristologia e nada mais. Segundo Brown, “apesar de todas as suas falhas, a Church Dogmatics é a obra mais impressionante dos tempos modernos a ser escrita por um único autor”.

4. A IGREJA CONFESSANTE

Entre 1933 e 1934, Barth envolveu-se no movimento de resistência à presença do nacional-socialismo dentro das igrejas luterana e reformada. Dessa resistência originou-se a Igreja Confessante (Die bekennende Kirche), apoiada por Dietrich Bonhoeffer, Hermann Hesse e Martin Niemöller, que em 4 de janeiro de 1934 se reuniu como concílio livre das comunidades luteranas-reformadas em Barmen, o que deu início à “disputa pela Igreja” (Kirchenkampf). Um concílio confessante ocorreu em 31 de maio deste mesmo ano, onde foi aprovada a Declaração Teológica (Declaração de Barmen).

    Por não querer começar suas aulas com a saudação nazista, mas persistir em começá-las com uma oração, Barth foi suspenso como professor universitário, sendo expulso da Alemanha, em 1935. Passou, então, a lecionar na Universidade de Basiléia, na Suíça. Após o fim da Segunda Guerra, Barth engajou-se em polêmicas sobre o batismo, hermenêutica e o programa de “desmitologização” (ou melhor, a “interpretação existencial” de Bultmann, em que divisava um retorno à teologia liberal do século 19). Ele também participou na assembléia de fundação do Conselho Mundial de Igrejas, em Amsterdã, Holanda, realizado entre 28 de agosto e 4 de setembro de 1948.

5. A HUMANIDADE DE DEUS

    Barth continuou coerente em suas posições básicas, mas revisou algumas de suas opiniões. Nos primeiros anos do movimento neo-ortodoxo, Barth enfatizou fortemente a transcendência de Deus. Em 1956, numa preleção sobre a Humanidade de Deus, Barth reconheceu que havia sido unilateral demais, por causa da necessidade da época. Agora era necessário haver outra mudança, mas não em oposição à ênfase anterior na transcendência de Deus. Junto e incluído na transcendência de Deus está sua humanidade – em Jesus Cristo.

Esta modificação atingiu até mesmo sua compreensão da revelação natural. Ele contrastou Jesus Cristo, a única Palavra de Deus e a única luz da vida, com outras ‘palavras verdadeiras’ e ‘luzes menores’ através das quais ele fala. Estas incluem a palavra não-cristã e a criação física. Mas Barth ainda insistiu que estes ainda não são independentes da única revelação de Deus em Jesus Cristo.

      Em seu último curso na Universidade de Basiléia, Introdução à Teologia Evangélica, em 1962, Barth definiu a existência teológica, que fora sua paixão: admiração diante do objeto teológico, submissão ao objeto incomparável, compromisso, fé. Com o termo “evangélica”, Barth não pretendeu assinalar um novo objeto da teologia nem uma nova perspectiva teológica, mas sim uma atitude particular, uma disposição interior do teólogo. O objeto e a perspectiva estão sempre em Cristo. E não poderia ser de outra maneira, dado que o Deus do Evangelho não é outro senão Jesus Cristo. Mas o Deus do Evangelho, Cristo, é abordado com uma atitude de humildade, modéstia, respeito, temor. Na meditação teológica, a mente deve deixar ser guiada por ele; nunca pode pretender submetê-lo aos seus critérios, sejam os da história, da psicologia, da política, da metafísica ou da antropologia. Qualquer espécie de racionalismo é um atentado contra a teologia evangélica e deve ser drasticamente reprimido. Deve-se adorar somente a Deus, a Escritura basta para guiar a Igreja no sentido da verdade e a graça de Cristo basta para regular nossa vida.

      No período de 1962 a 1965 Barth enfrentou várias enfermidades, com diversas operações e internações hospitalares. Neste tempo, sua influência teológica já estava em declínio. Por esta época Carl Henry escreveu:

Com a idade de setenta e nove anos [1965], porém, as enfermidades próprias da decrepitude fizeram com que os pensamentos de Barth se voltassem mais e mais ‘para a tenda que começa a ser desfeita’, como ele teve ocasião de expressar-se. Apesar de ele continuar a manter seus colóquios mensais na sala que fica nas escadarias do Restaurante Bruderholz, próximo de sua residência em Basiléia, o fato é que a obra criadora de Barth já começou a tornar-se morosa, de modo que ele não se sente certo da possibilidade de levar a termo sua Dogmática da Igreja. Ativamente, mas com cautela, tem estado a modificar sua teologia na direção de uma concepção de objetividade, a fim de fugir à expropriação bultmaniana. ‘Barth quase se tornou outra vez um escolástico protestante’, assim ironiza Gerhard Friedrich, erudito do Novo Testamento de Erlangen. ‘Mais e mais o vemos a pender para o que é histórico, em detrimento do que é existencial’. Entretanto, o sentimento generalizado é de que as revisões que se processam na teologia de Barth são ‘demasiado mínimas e tardias’... Isto significa que as revisões propostas à teologia de Barth se vêm arrastando demasiadamente, para que possam proporcionar algum apreciável impacto sobre a linha principal da teologia continental.

        Em 1966, foi nomeado Senador Honorífico da Universidade de Bonn, tendo viajado neste mesmo ano para o Vaticano, em setembro. Karl Barth faleceu em 10 de dezembro de 1968, aos 82 anos, em Basiléia. A última palavra que pronunciou, na noite anterior, em telefonema a seu amigo Thurneysen, foi: “Deus não nos abandona a nenhum de nós e tampouco a nós todos juntos! – Há um governo!”

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