IEFP e sua tarefa
O Instituto Ecumênico Fé e Política - IEFP, desde sua fundação, propõe ser um espaço de afluência de lideranças religiosas, em busca de uma convivência respeitosa de sua diversidade.
Para tanto, abre-se à sociedade, com sua proposta, consciente dos desafios que isso representa. Não se ilude que, para que haja justiça e paz, muitas vezes será necessário a denúncia do erro.
Portanto, a liderança do IEFP e seus membros partem do princípio de que é necessário, primeiro para si mesmos, assumir uma crítica de costumes. E qualquer crítica se torna, ao mesmo tempo, construtiva e destrutiva.
Quando se trata de religião, exatamente o expediente ligado à palavra "Fé", de seu nome, lida-se com o transcendente, ao mesmo tempo que com tradições, ritos, doutrina e com o próprio sagrado.
E quando se trata de sociedade, expediente ligado à menção "Política", em seu nome, lida-se com ideologias, sistemas políticos, partidos, pluralidade social, escolhas diversas, assertivas ou não.
Assim como, na religião, a pluralidade religiosa aflora, no IEFP, como essencial, do mesmo modo na política, o senso suprapartidário constitui-se no seu principal eixo, como modelo de autocrítica, seja no contexto religioso, assim como no contexto político, o que não se constitui numa tarefa fácil.
Principalmente no viés de opção.
A tarefa será de se constituir, a si mesmo, no contexto religioso, assim como político, no Brasil, onde a mais recente polarização dificulta que palavras de bom senso e crítica sadia, isenta, prevaleçam.
O mais corriqueiro, no contexto social atual, são posicionamentos radicais e acusações contra o outro, assim como a taxação recíproca de posições antagônicas, sem que o diálogo e as diferenças sejam postas no seu devido lugar de convivência.
Nesse contexto é que o IEFP se propõe a ser lugar de mediação. Deve, portanto, praticar uma crítica constante a si mesmo, com espaço plural e igual a todos os seus membros, seja no teor religioso, assim como político, de modo a oferecer-se, à sociedade, como modelo de mediação.
IEFP e o contexto amazônico
Não se pode decalcar a Amazônia do contexto nacional, como se fosse um lugar isolado, sem fronteiras e sem influências externas. Assim como não se pode confundi-la ou misturá-la, em termos culturais, com as demais regiões do país.
Ela possui características próprias, assim como assume, herda e incorpora aspectos, sejam positivos ou negativos, das outras regiões, moldada por movimentos decisivos que a marcaram, desde sua "colonização".
Aqui se deve operar uma divisão conceitual entre religião, e suas intenções, e a capacidade inata ao ser humano de, além de propor e definir, para si, religiões, assumir o viés da imposição, com violência, ao outro, muitas vezes numa relação também conflituosa com outros expedientes da sociedade.
Por exemplo, na repressão aos indígenas, no início da ocupação europeia da Amazônia, religião, forças armadas e colonizadores deram-se as mãos para se impor uma religião majoritária, juntamente com o poder político opressor, nesta região, desfigurando o quadro original de seus povos e tradições.
Porém isso não quer dizer que os povos que aqui viviam eram puros, perfeitos, isentos de maldade, tendo todos eles uma cultura religiosa irretocável, como se o paraíso bíblico perdido fosse aqui. O choque cultural foi e sempre será inevitável e imposições, sejam religiosas ou políticas, que têm sido violentas, na evolução da humanidade, desde sempre, carecem de denúncia e correção.
Não existem nem religiões e nem ideologias políticas perfeitas, porém estão em vigência em função e apesar das imperfeições humanas. Não será a singela proposta de uma religião, à qual se "converter", ou a mera proposta ou imposição, em si, de qualquer ideologia, que vão "salvar" a humanidade.
Portanto, quem está sujeito à crítica é a condição humana, em geral, na vivência dos choques culturais, os sistemas de governo e seus modelos de condução do povo. Qualquer modelo de opressão, ainda que mal disfarçado em ideologia ou religião benfazeja, deve ser denunciado.
Exemplos retirados da história
Caso se deseje focar em Jesus, expressão do cristianismo, ele contestou aspectos da religião judaica oficial e, por isso, teve sua ética e a própria vida postas em xeque.
O profeta Oseias, no século VIII a.C., desqualificou a estrutura sacerdotal de seu tempo, Jeremias, a partir de 605 a. C., que lia Oseias, idispunha-se com o poder religioso e o político de seu tempo. E Isaías, contemporâneo de Oseias, denunciou a idolatria em Israel.
Mas não quer dizer que apenas abandonar a idolatria resolva todas as questões, porque o Israel não idólatra crucificou Jesus e o cristianismo da Idade Média, não idólatra, patrocinou "guerras santas" chamadas Cruzadas.
Há, de sobra, na história, maus exemplos de sistemas políticos, ambos, à esquerda e à direita, se assim se desejar definir, praticando genocídios. Não existem ditaduras benéficas, sejam de direita ou de esquerda, ambas sempre apoiadas por militares. Assim como não existem democracias perfeitas.
O IEFP, caso deseje se expor como modelo de mediação, seja religiosa ou política, deverá ser crítico da condição humana que justifique qualquer tipo de violência como necessária, seja ela religiosa ou política.
A violência praticada contra indígenas, na gênese da ocupação europeia da Amazônia, foi político-religiosa. Do mesmo modo que a opressão praticada contra os negros, ignorada pela Igreja, desconsiderada pelo rei "cristão", assim como benéfica para o sistema político-financeiro, fosse católico, anglicano ou protestante.
Mas não cessou aí, nesse tempo, nem a opressão religiosa e nem a opressão política. Caso o IEFP deseje assumir que a democracia, se não é o melhor regime, ainda é o melhor fórum social, deve denunciar, tanto a democracia que oprime, mas também os regimes que a rejeitam, definitivamente, e não a praticam.
IEFP e seus desafios
Não será uma tarefa fácil, para os membros do IEFP, administrarem suas perdas e ganhos. Porque lidar com religiões é admitir choques culturais, com suas perdas e ganhos, do mesmo modo no contexto político, com suas diferenças, diversidade e contradições.
O IEFP deve primar por sua autonomia de modo permanente. Caso se interponha como lugar de debate, seja religioso ou político, a começar por seus membros, deverá aprender a exercitar seu potencial interno de conviver, de maneira pró-ativa, com a diversidade e sua capacidade interna de dialogar, e ainda lidar com o contraditório, seja no contexto político, do mesmo modo, quanto no religioso.
As carências da Amazônia são, em grande parte, reflexo das carências nacionais. E a política que se pratica no Brasil ainda tem os vícios dos interesses pessoais à frente do interesse púbico. Por isso a política de trato para com essa região ainda é de exploração de recursos, regida por interesses financeiros, atrelada a uma administração pública corrompida.
Assim como na ocupação dela, no século XVII, houve uma associação de interesses político-religiosos que se aliaram contra a cultura e a população indígena local, visando exclusivamente sua exploração, na fase atual ainda há o que corrigir quanto à associação de interesses, embora as forças de exploração sejam outras.
Macro religiões e seu conflito de interesses devem ser levadas em consideração. Na atualidade, costuma-se acusar evangélicos, denunciando, de modo acertado, sua promiscuidade com o poder político, esquecendo-se de que católicos sempre ocuparam esse mesmo espaço promíscuo, afetando a laicidade do Estado, desde o "descobrimento" do Brasil.
Caso o IEFP se mantenha como referencial à sociedade, além e juntamente com sua postura isenta e equidistante, em relação às religiões, deverá manter sua postura política, do mesmo modo, plural, isenta e equidistante.
Caso nesse permanente esforço de equilíbrio entre a dimensão Fé, de sua identidade, e a dimensão Política, dessa mesma identidade, não ocorra permanente esforço de isenção, sua tarefa estará comprometida. E seu espaço como fórum social para debate religioso e político, no contexto social, estará desconfigurado.
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