Por esta causa
Paulo decidiu orar e expôs a causa por quê. Poderíamos deduzir, a partir desse texto, que toda oração tem ou deve ter uma causa. E, para que se constituísse numa oração de alto nível, vamos usar tal termo, de total credibilidade e grandeza de conteúdo, uma causa plena e justificável.
Mas, na verdade, como recurso último, ao alcance de quem é único em seu uso, o ser humano, sim, porque anjos não oram, a oração não exige tais requintes. Claro que a Bíblia a apresenta, como vamos dizer, portadora de certos padrões, certa normas, certo controle de qualidade, instruções, enfim, para que seja coerente levá-la a efeito.
Na aula que Jesus ministrou por ocasião do Sermão do Monte, assim chamado, ensinou que devemos nos dirigir, também único a quem encaminhar uma oração, ao Pai. Revolucionário, sim, porque chamar Deus de Pai, partindo da boca de qualquer homem (ou mulher, principalmente), na mentalidade judaica da época, era pura blasfêmia. Total blasfêmia.
Era intimidade demais. Mas é este o ponto de partida de qualquer oração, intimidade para dirigir-se a Deus como Pai. No mesmo sermão, Jesus dá outras instruções sobre oração. Evitar exibição, fala rebuscada, como se quisesse ser visto, ouvido, dignificado, orações públicas, de efeito, só para aparecer, usando este termo coloquial. Pura vaidade, não pense que haverá efeito, para Deus, haverá, apenas, falsidade e engano para ouvintes desavisados. Hipocrisia, que é máscara.
Orações quilométricas, Jesus desaconselha, pelo muito falar pensam que vão ser ouvidos. Vão cansar Deus. Pelo caráter daquele a quem são dirigidas, as orações não precisam ser longas, nem cheias de floreio, requintes, tentativa de ouvir de si para si, com o intuito de autoavaliar-se um orante de alto nível. Como diz Jesus, já recebeu a recompensa, ou seja, alimentou-se da própria soberba, viu-se a si mesmo no espelho, como diz Tiago, para logo esquecer-se.
Orações repetitivas, por razões variadas, que podem ser de uma insistência em obter algo que muito se deseja, mas que não convém ou não é urgente ou inteligente pedir. Fundamental é o que Jesus ensinou pedir na chamada Oração do Pai Nosso. Ali está o fundamental, e ainda se torna necessário refletir sobre que meios são necessários ao homem para que se cumpram ou sejam acertadas, no dia a dia, a ocorrência daquelas principais necessidades ali expostas.
O que a mim cabe para que seja santificado o nome do Pai? E para que venha o Reino, a cada dia, visto, enxergado em mim e aberta a porta para que outros nele entrem. Ah, o mais difícil, o que cabe a mim para que a vontade do Pai seja feita na terra? Para que seja feita no céu ou, uma vez feita no céu, está posto o padrão para que se faça na terra. E para que o pão nosso de cada dia chegue a nossa mesa, sim, e para que chegue à mesa de quem falta?
Depois de que a vontade seja feita, aqui embaixo, no mesmo modelo de como é feita lá, em cima, esta agora é a mais difícil, tão ou mais do que essa outra, que é perdoarmos como Deus perdoa. Está posto que a condição de crente está restrita a certos indicadores dos quais não podemos fugir ou negar, se praticamos ou não praticamos. Perdoar-se, ou não, na proporção idêntica do modo como Deus perdoa, e isso se chama amor: ou se perdoa assim, ou não se perdoa. Soa falso.
E o que devo fazer para não me deixar cair em tentação? Deus sempre está disposto a livrar-me do mal (ou livrar-me de ser ou tornar-me mal, agora que me converteu a Si), sim, mas como vou me colocar, diante de Deus, na condição de ser livrado do mal? Jesus sempre se colocou em condição de ser livrado do mal. Na tentação, primeiro, colocou a palavra de Deus acima da intenção de satanás de ordenar a ele o que deveria fazer.
Em segundo, Jesus não duvidou das intenções do Pai a seu respeito, quando satanás quis supor ou induzi-lo a supor que Deus, apenas por um momento que fosse, faltaria em guardá-lo. Jesus não precisava colocar o Pai em prova, como nenhum de nós precisa ou vai duvidar que Deus, permanentemente nos guarde. E, em terceiro, satanás não desviou de Jesus a exclusiva atenção que concedia a si mesmo de somente adorar o Pai. Uma vida de adoração, para que seja autêntica, pressupõe santidade. Jesus se comprometeu com o Pai em preservar sua santidade, negando-se a adorar qualquer outro e repreendendo satanás, adorador de si mesmo.
Jesus é meu modelo de oração. Repita isso para você mesmo. Não que a repetição mecânica vai virar um mantra e te fazer maduro em oração, mas que pratiquemos isso, ou seja, pratiquemos as instruções de Jesus para aprender a orar. Jesus orou publicamente, diante de Jerusalém, quando chorou porque a cidade recusou crer. Orou publicamente, também, diversas vezes, quando invocou o Pai para efetuar, em nome do Pai, em obediência ao Pai e invocando o nome do Pai, os milagres que o confirmavam como Filho de Deus e salvador dos que creem. Jesus orou com os discípulos, orou sozinho, reservado, à parte, orou no Getsêmani, sozinho, quando desejava orar em comunhão. Jesus é meu modelo para a oração.
Frágeis como somos, muitas vezes nossa oração tem uma causa que até pode mesmo ser infantil. Ou uma causa deslocada de importância, esta, quando deveria ser aquela. Por esta causa me ponho de joelhos diante do Pai. Creio que a melhor maneira de, digamos assim, selecionar a causa certa, bem centrada, para uma oração qualquer, é treinar. Orar muito e orar sempre. Porém, adquirindo certo traquejo para fazer um controle de qualidade, como diz Paulo, para não sermos como meninos, levados ao redor por qualquer vento ou artimanha de homens. Enganado-nos a nós mesmos (ou sendo enganados).
Orar como Jesus orou. Folhear a Bíblia, não displicentemente, mas com fome e sede dessa Palavra, que vai nos ensinar modelos de oração. Salmos, quantas orações nesse livro! As orações de Abraão, o crente mais citado na Bíblia. As orações de Eva. Orações de Abel, de Daniel, de Neemias, de Jeremias. Modelos de oração, meditar neles e pedir a Deus que, por meio de seu Espírito, nos instrua, para que sejamos lúcidos, que nos permita enxergar, para dentro de nós, assim como para fora de nós, situações que nos amadureçam em nossa conversa e relação com o Pai.
Como disse o próprio Jesus, vós orareis assim, assim devemos orar, para aprender a enxergar o mundo com outros olhos, pressentindo, como Jesus, tendo as mesma motivações que Ele teve, quando sentia necessidade de orar. Por esta causa me ponho de joelhos diante do Pai.
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