quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

Artigos soltos 35

       As casas.

        Elas passam. As pessoas também passam. Estas passam por aquelas que, vez por outra duram, às vezes, muito mais tempo.

     Aqui no Acre, morei numa casa que não mais existe. Toda a quadra onde estava foi subvertida por uma loja de peças automotivas. 

     Essa casa era uma miniatura da anterior, onde havíamos morado de 1995-1998. No início deste ano já mudamos para esta que não mais existe.

     A anterior resiste ao tempo. Esta que se foi tinha também dois quartos. Uma divisória interna de madeira separava sala de estar daquela de jantar.  Uma cozinha miúda e área externa à toda a volta. 

     E um poço famoso nas cercanias. Dele se contava que, numa estiagem de anos atrás,  a vizinhança do enclave ali se socorreu, porque foi a única fonte que não secou.

     Na casa anterior eu e minha esposa fazíamos vigílias para conseguir água nas madrugadas da vida. E também havia uma geringonça inventiva, que era uma adaptação de um flange no fundo de um balde, para captar água da chuva na calha da garagem. 

     Mas nesta última, água em abundância. Ali chegou Isaac com 5 e Ana com meses. Ali Dorcas avó deu de comer as primeiras refeições a sua neta. Ali tinha um mamoeiro de mamões com cor e gosto jamais vistos.

        Dali colhia goiaba para a filha degustar. Filho, com 6 anos, filha, com ano e meio, brincaram juntos na piscina de armar. Ela deitava dormindo no meu dorso, escorria por minhas pernas e, com o menino, brincávamos de trenzinho e soldadinhos no chão da sala.

     Chegamos e retiramos um montão de terra da vaga do carro, a Parati 97 verde-musgo. Ficava em frente ao portão do 7o BEC, que mudou sua entrada, deixando erma e vulnerável a vista de entrada de nosso portão lateral.

      E foram mesmo dois furtos e ameaça de um terceiro que nos jogaram na busca pela casa atutal, que lá vão, pelo menos, 16 anos em que lá residimos. 

     Saudade daquela casa. Das coisas daquela casa. Saudade do licor de genipapo que nunca provamos. Porque a sequência de potes repousava sobre prateleiras que, cuidadosamente, encaixamos na cozinha, próximas ao teto.

     Não contávamos que a fermentação aumentaria seu peso. Então,  fomos acordados,  manhã de sábado,  até mais tarde na cama, pelo estrondo de todas elas e os potes arrebentando-se no soalho duro, frio e feio. 

      O aroma perdurou durante dias. O sabor nunca sentimos. E o trauma perdura até hoje. Nunca mais a esposa tentou, de novo,  qualquer licor. E nunca mais a velha casa.

     Ela passou primeiro do que nós.

Nova entrada do 7o BEC

Justo a esquina da velha casa


O velho  e único 
portão de acesso 

A velha caixa d'água, 
do jeito que a deixamos

Lojas à frente da casa,
anexas ao mesmo terreno

Antiga entrada do Batalhão:
com sua mudança, 
ficamos desguarnecidos

      

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